01/11/2021
Ano 24
Número 1.246





 

ARQUIVO

PEDRO FRANCO


 


 

 


Que vão dizer?

Que murmuren – bolero de Eliades Ochoa, cantado primeiro por Gregório Barrios e depois por Dolores Duran, Altemar Dutra e outros. Tem a ver com o texto. “No me importa que murmuren.”

De fato, se vivemos em sociedade, é necessário pensar em algumas repercussões que alguns de nossos atos podem permitir. Se alguém tem proeminência, deve também se preocupar com os julgamentos da posteridade. Muitos tentam mexer seus pauzinhos, para que Dona História lhes pinte em cores exitosas e não com as decepções que seus atos fizeram por merecer. Só que a verdadeira História costuma ser veraz e historiadores lutam por preservar o fato acontecido e não o que foi retratado nos momentos das ocorrências. Vejo muitas histórias recentes serem mal contadas. E acredito que alguns, olhando no espelho da autocrítica honesta, pensem no julgamento, por exemplo, da neta querida. Gostariam que este descendente pensasse, vovô foi um homem de bem! Só que este julgamento não acontece. O avô agiu sem pensar na posteridade, ou teve a impressão que poderia comprar uma boa avaliação com os dinheiros escusos conquistados. E a neta viu seu verdadeiro retrato histórico. E se escrevi sobre a necessidade da boa imagem pública, vou às ações de alguns particulares conhecidos no meu dia a dia. E é uma contrapartida, porque há também uma censura prévia, pessoal e mal dimensionada sobre o que vão dizer. Estas pessoas vivem em sobressaltos em função das vozes no em volta. Vou dar exemplo prático. Sua filha namora, só que mesmo chovendo canivetes, o namorado tem que, às vinte e duas horas, ganhar a rua, pois, se fica, que dirão as fofoqueiras do prédio. Ela própria viúva e sem ter coração partido pela morte do pilantra e ex marido, gostaria de voltar à sua vida normal e usar roupas condizentes com sua vontade e idade. Que dirá sobre suas roupas normais a Tia Euzébia, que mora perto? Era devotada ao falecido e agora quer ser a juíza da sua vida. Inclusive de seu guarda roupas. Pior é que a viuvinha e não é uma das viúvas do nosso Machado de Assis, veste-se e age para não chocar a Tia Euzébia e sem seguir suas naturais vontades e moda. E sua atenção e comportamento se acanham perante o que vão dizer. E muitas situações desnecessárias vive, pois agiu censurada pelo que vão dizer. E vozes sem qualquer importância em sua existência apequenam sua vida, pois não tomou as atitudes e ações devidas, porque deu vaza ao que vão dizer. E muitos amores esbarram e não ocorrem, porque um dos amorosos não teve coragem de ir ao sentimento, com medo da maledicência alheia. E, perder o amor, pode ser a perda da única salvação de uma existência. Ninguém pode, por falar e na maioria das vezes sem razão, viver em função do que vão dizer. Há bolero que conta em espanhol, passado agora para portunhol, avisando. Falem o que falem, digam o digam, tu me pertences, esta é a verdade. Então não ligou ao que falavam, ou diziam, pertenciam-se, esta sim é a verdade histórica dos sentimentos de uma vida. Muitas vezes vozes de “malquerência” se levantam solenes e estão baseadas apenas em preconceitos, racismos e vidas pessoais raivosas. Adeus, vozes sinistras, penso por mim e tomo decisões condizentes com o que de fato penso e julgo. Adeus ao que vão dizer!


Comentários sobre os textos podem ser enviados ao autor, no email pdaf35@gmail.com 



Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia da UNI-RIO.
Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral

Conheça um pouco mais de Pedro Franco.



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