01/10/2021
Ano 24
Número 1.242

 

 

ARQUIVO
IRENE SERRA





 

Irene Serra


 Sem flauta, um encantador de animais
 

Irene Serra - CooJornal

Logo que chegamos ao sítio e a vimos, aquela pimpolhinha nos encantou. Escorregava entre nossos pés. Olhava com uma carinha pedindo colo e não adiantava colocá-la junto aos irmãos, ela se esgueirava e voltava a se enrolar em nós. Foi paixão imediata. Completava, naquele dia, 1 mês de vida. Sua mãe, sobrevivente da enchente em Teresópolis, dava sinais de voltar a ficar debilitada e estava com pouco leite para alimentar todos os filhotes. Nada mais justo que aquela doçura viesse conosco. E, assim, Mel chegou à nossa casa.

Na primeira noite não dormiu. Chorou o tempo todo, enroladinha, e nós a niná-la. Imagino a saudade que sentia da família canina e da Márcia, tão meiga em seu trato. Aos poucos foi se acostumando e, em duas semanas, já é senhora e rainha. Rói sapatos, fios, pés de mesas, enfim, o que encontra pelo caminho. Anda dando pulinhos e faz nossa alegria, que tanto precisávamos voltar a sorrir. Agora, o que mais gosta de fazer é dormir, dormir, dormir... Cresce a olhos vistos e estamos de plantão para descobrir o primeiro latido. Parecemos pais de primeira viagem.

Mel ainda não fez amizade com Sansão e Dalila, nossos outros cães, sendo que Sansão morre de medo quando ela aparece, e me dá pena ver seu olhar de tristeza correndo e se escondendo em sua casinha ou debaixo do sofá na garagem; já, a Dalila, sobe na mesa da varanda e fica por lá, espreitando. Ambos só saem quando carregamos a pequenininha. Mas é bom eles se acostumarem depressa, pois logo a tiraremos de dentro de casa, pois é nosso intuito que eles convivam em harmonia, no quintal.

Logo que Mel chegou, a levamos no Marquinho para recebermos orientação no trato e tudo mais que se fizesse necessário. Ele lhe deu um biscoitinho de borracha e ela fica horas entretida, afiando seus dentes. Como tem se coçado muito, mesmo com o uso do remédio de pulga aconselhado, hoje pedi socorro para que ele lhe desse banho – mesmo sabendo que  esse procedimento no primeiro mês é inadequado. E ele, compreensivo, veio olhar nossa menina, chegando com inúmeros apetrechos. Eu estava apreensiva, não nego, pois sei o quanto Mel fica agitada com movimento, mas no mesmo instante ela já estava em seu colo.

Saí para pegar outra toalha e, ao voltar, não pude deixar de ficar à porta, ouvindo-o assobiar docemente enquanto lhe dava o banho. Entrei devagarzinho e tive a sensação de que os dois estavam unidos em algum outro lugar, ela a adorá-lo, murchinha de molhada, e ele a abraçá-la, firme, sem se incomodar com o que os rodeava.

Marquinhos, bom amigo, não precisa de flauta. Com seu assobio e canto tranquilos, é um verdadeiro encantador de animais!
 

 

(16 de novembro/2011)
RT, CooJornal no 762

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Irene Vieira Machado Serra
foniatra, editora da Revista Rio Total
RJ 
irene@revistariototal.com.br

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