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Tu Bishvat Plante essa ideia

Jane Bichmacher de Glasman
B”H
Tu biShvat, o "Ano Novo das Árvores", este ano comemorado no
dia 22 de janeiro, mas pelo calendário judaico, não apenas o dia é fixo, como
define o nome da festa: as letras hebraicas tet e vav, que formam o Tu, têm
valor numérico 9 e 6; como 9+6= 15, significa que se comemora no 15º dia do mês
hebraico Shvat.
É o ano novo das árvores em referência ao cálculo do
dízimo dos frutos, que devia ser entregue aos Levitas na época do Templo, numa
jornada festiva. “A explicação mais comum dos rabinos [para a data ser ano novo]
é que o fruto das árvores começa a se formar. A maioria das chuvas de inverno já
caiu e a seiva das árvores já surgiu. Há um debate no Talmud (Rosh HaShaná 14 a)
sobre se esta mudança na natureza deveria ser marcada no 1º ou no 15º dia de
Shvat. De qualquer modo, Tu Bishvat era visto como um precursor da
primavera[3]”. Com o exílio e a Golá, a Diáspora judaica, passou a ser celebrado
enfatizando nossa conexão com Eretz Israel.
Comer-morando
Celebramos preparando uma mesa com frutos, tipo um luau kasher, com
shivat há-minim, as 7 espécies citadas na Torá (Dt 8:8) como especiais de
Israel: trigo, cevada, uva, figo, romã, azeitona e tâmara. O mel é o das tâmaras
e não de abelhas. “As amêndoas também tinham um lugar proeminente nas refeições
de Tu Bishvat, pois se acreditava que as amendoeiras fossem as primeiras árvores
a florescerem em Israel. Apesar de não estar mencionado no versículo de
Deuteronômio, a alfarroba era a fruta mais popular a ser usada, já que poderia
sobreviver à longa viagem desde Israel para as comunidades judaicas da Europa,
do norte da África, etc[4]”. Outro costume é ter 15 frutos diferentes na mesa
para simbolizar o 15 de Shvat. Também procuramos uma fruta que ainda não comemos
neste ano, para recitar a bênção Shehe’heianu. O costume de comer frutos
tornou-se Halachá (Shulchan Aruch, Orach Hayim 131:16).
O Seder
Cabalístico Na época do ARI, Rav Isac Luria, os cabalistas
atribuíram a Tu Bishvat um significado adicional, expressando a relação entre o
homem e a terra e seus frutos. Visando ao Tikun Olam (reparar o mundo
espiritualmente), interpretavam o comer frutas como uma forma de expiação pelo
fruto da Árvore do Conhecimento comido no Gan Eden. Para eles, árvores
simbolizam a Árvore da Vida, que leva a bênção divina ao mundo. A relação entre
o comer e a Árvore da Vida, é explicada, pelos cabalistas, através do número de
dentes que um ser humano adulto tem (32) como mesmo número de vezes que a
palavra Elohim (Deus) figura no relato da Criação: a mastigação usando os 32
dentes conectaria diretamente com a Criação e sua continuação.
Os
cabalistas de Safed no século XVI criaram um Seder de Tu biShvat semelhante ao
de Pessah, descrito em Pri Etz Hadar: bebe-se 4 copos de vinho e come-se 3
grupos de 10 tipos de frutas (e nozes). As 4 taças de vinho são tomadas, uma
mais vermelha que a outra, simbolizando as mudanças de tons das flores em Israel
ao longo do ano. Outra explicação é que o vinho branco representa a natureza
adormecida e o tinto, a natureza em ação.
Comendo as frutas com kavaná
(intenção apropriada), ajudamos na refrutificação do nosso mundo a partir da
divina Árvore da Vida. Os 3 grupos de frutos são: 10 que podemos comer por
inteiro, como o figo; 10 dos quais se come a polpa, mas não a semente, como a
tâmara; e 10 dos quais se come o interior, mas não a casca, como a romã. “O
número 10 representa as 10 sefirot (emanações) através das quais o fluxo divino
vem a este mundo. Cada um dos 3 grupos representa um nível de criação. De acordo
com a Cabalá, há 4 mundos ou 4 níveis de criação: Atzilut (emanação), Briá
(criação), Ietzirá (formação) e Assiá (ação - o nosso mundo de realidade
física). O mundo de Atzilut é puramente espiritual e não pode ser simbolizado
através de nenhuma maneira concreta[5]”. O simbolismo sintético é: as partes que
podem ser comidas representam santidade; as não comestíveis, impureza; as
cascas, proteção para a santidade. Também simbolizam 3 tipos de situações
interpressoais, quando nós usamos (mais ou menos) uma “casca”, como a proteção
que precisamos, como nos “armamos” (ou não), dependendo do ambiente e das
pessoas com quem estivermos em contato- indo do hostil à total confiança.
Costumes e simbolismos... politicamente corretos! Um
antigo costume de Tu biShvat era plantar um cedro para cada varão que nascia e
um cipreste para cada menina. Quando se casavam, os ramos destas árvores,
plantadas em sua homenagem, eram usados para a hupá (dossel nupcial). Assim a
árvore era associada ao ciclo de vida judaico[6]. Hoje em dia, em Israel, é
costume plantar árvores, para aproximar as pessoas da terra e para o
reflorestamento, marcando a data como uma das mais antigas práticas ecológicas.
Ainda atinente ao binômio Judaísmo & Ecologia, a Torá proíbe cortar ou danificar
uma árvore que dá frutos (Dt 10:19), cruzar árvores em crescimento para produzir
uma nova classe de frutos e não comer os frutos de uma árvore durante os 3
primeiros anos (Lv 19:23), já mencionado, período que termina em Tu biShvat, no
quarto ano após o plantio, de acordo com o Shulchan Aruch (Yore Deah 24:4).
“O plantio de árvores em Israel é uma das 613 mitzvot, parte importante do
preceito de povoar a Terra de Israel. No Midrash (Tanchumá, Parashat Kedoshim,
8) é dito: Hakadosh Baruch Hu disse ao Povo de Israel: 'Ainda que a encontrardes
repleta de tudo que é bom, não digais: sentemo-nos e não plantemos; ao
contrário, sede cuidadosos e plantai'. Pois é dito: 'E plantareis toda árvore
frutífera'. Do mesmo modo que entrastes na Terra de Israel e ali encontrastes
cultivos feitos por outros, devereis plantar para vossos filhos'. A plantação
de árvores é também um dos itens da adesão a Hashem, conforme escrito no Midrash
(Vayikrá Rabá, Parashá 25): Desde o início da Criação do Mundo, D'us se ocupou
do cultivo da terra. Conforme está escrito (Gênesis, 2:8): 'E plantou o Eterno
D'us um jardim no Éden'. Também vós, ao entrardes na Terra de Israel, vos
ocupareis primeiro do seu cultivo[7]”. Podemos também, simplesmente, fazer
passeios, nos colocando em contato com a natureza - política e ecologicamente
correto, além de saudável! A Torá compara o ser humano às árvores: "Pois o
homem é como uma árvore do campo" (Dt 20:19). Assim como as pessoas são julgadas
em Rosh haShaná, as árvores são julgadas em Tu biShvat. Nesta data também
devemos repensar os exemplos que as árvores inspiram: 1.Uma árvore se compõe
de raízes, tronco e frutos; o homem também. As raízes, não se vê; estão
escondidas sob a terra, mas é delas que a árvore tira sua força e vitalidade.
Quanto mais fortes forem, mais forte será a árvore. No homem, as raízes são a fé
e também por onde absorve o saber. O tronco, a parte mais evidente da árvore
seria como o homem se mostra ao mundo. Quanto aos frutos, a plenitude de uma
árvore só é atingida quando começa a dá-los. Para que serviriam raízes profundas
e um tronco imponente, se nada vivo saísse dos mesmos? No homem, frutos
simbolizam a capacidade de ajudar e ensinar, tornando-o uma árvore sólida.
2.Das árvores podemos (e devemos) tirar também outro ensinamento: a humildade.
As árvores são diferentes no inverno e no verão (embora aqui em "Pindorama" seja
menos evidente...) No inverno, quando os frutos já foram colhidos e as folhas
caíram, as árvores ficam retas, os galhos apontando para cima. No verão,
carregadas de frutos e folhas, as árvores se inclinam com o seu peso. O mesmo
acontece com os seres humanos. O homem vazio de conhecimento é arrogante e
orgulhoso. O homem sábio se curva, pois quem é realmente grande é
verdadeiramente humilde. A palavra humildade todos conhecem, difícil é
aplicá-la na vida prática... Ela é necessária no convívio com os outros e no
relacionamento com Deus. O sucesso cega as pessoas a ponto de perderem-No de
vista. Na presença da doença ou da morte, todos são humildes, mas quando a
sombra negativa se afasta, o antigo orgulho volta e Deus sai de cena. Todos nós
podemos ter tido esta atitude alguma vez... E você - o que acha?
Tu biShvat é o ano novo mais “politicamente correto”: como ano novo das arvores,
fala da ecologia, a celebração e a preservação da natureza que torna o ser
humano “parceiro do Criador”, como responsável pela manutenção de sua obra, da
criação- o que lhe confere um caráter (e exemplo) universal. Por outro lado,
costumes da festa falam do indivíduo (ao comer um fruto na data, lembra que há
sempre algo novo a ser experimentado, vivenciado -e por isso, de uma doce forma
ensina humildade, contra a soberba de quem acha que tudo sabe), da ligação do
povo judeu com Israel (colocando à mesa frutos característicos da “terrinha”) e
da preservação do judaísmo através da celebração do ciclo vital, descrito
anteriormente.
Feliz Tu Bishvat! Le-Hayim para as árvores! E enquanto
saboreamos seus frutos, não esqueçamos Quem é a fonte de toda vida. Que Ele
continue nos abençoando e possamos desfrutar com saúde e alegria os tesouros de
Sua Criação. Amém.
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[1]“Tu BiShvat – tempo de celebrar a passagem do tempo” www.pletz.com
colunistas: coluna Jane, fevereiro de 2001 “Tu biSvat: mais um ano novo,
kasher e politicamente correto” Revista Rio Total, fevereiro de
2001.www.riototal.com.br/cultura-judaica/ (História e Tradição) “A relação
do judaísmo com a natureza”, Revista Morashá nº 35 dezembro de 2001
www.morasha.com.br “Calendário e Ecologia juntos no Judaísmo”, Moadon,
articulista, www.moadon.com.br “3 x 15 = 3 x 7?” Visão Judaica nº 21
www.visaojudaica.com.br fevereiro 2004 [2]Jacob Richman reúne em seu site
links para outros 55 sobre Tu BiShvat; incluem explicações e costumes até jogos
e receitas, a maioria em inglês hyper-link www.jr.co.il/hotsites/j-hdaytu.htm
Encontramos entre eles sites brasileiros como www.netjudaica.com.br e
www.chabad.org.br Acesse o songbook- músicas na HomePage [3]
www.shalom.org.br/index_chaguim.html [4] Idem. Não deixe de consultar também
os comentários de Parashat háShavua de Rav Bergman, CIP News, Tropicasher, Meor
haShabat, Rav Kamnitzer www.eifo.com.br/indexpar.html [5] Para mais detalhes
sobre a visão cabalística de Tu biShvat visite www.shalom.org.br
www.chabad.org/library/article.asp?AID=465912 [6] Politicamente incorreto um
pouco de marketing pessoal: leia mais em "`A Luz da Menorá: Introdução à Cultura
Judaica", da autora deste artigo, Capítulo IV: Festas e Feriados Judaicos.
[7] “Por que a arvore precisa ano novo?” Por Rav Moshe Bergman, 22/01/2002.
Jane Bichmacher de Glasman é Doutora em Língua Hebraica, Literaturas e Cultura
Judaica, Professora Adjunta, Fundadora e ex-Diretora do Programa de Estudos
Judaicos –UERJ, escritora. janeglasman@terra.com.br
(RT, janeiro, 2002)
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Direção e Editoria
Irene Serra
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