22/05/2010
Ano 13 - Número 685


ARQUIVO
MILTON XIMENES

 

Milton Ximenes Lima



 Permanência


 

Milton Ximenes

Não sei como. Nos momentos seguintes ao que nasci, meus olhos absorveram a tristeza do mundo, que, escamoteada, passeava por perto. Talvez soprada pelo vento do instante familiar, repleto de dificuldades existenciais e de sobrevivência.

Um cansaço antecipado pesou sobre meus pensamentos futuros, perspectivas de pés machucados, suores dos embates, lágrimas para o acalanto da solidão, tudo, tudo enveredado por difíceis caminhos do viver...

Amei mais que fui amado. Não amealhei tesouros materiais de segurança, busquei decifrar os enigmas espirituais do oriente e do ocidente. Incompreendido em certos procedimentos, mas o sofrimento me permitiu a descoberta de almas irmãs.

Anos e anos, infantis, adolescentes e adultos, árduas subidas nas colinas, arranhões nas escaladas...

Teimosamente, porém, permaneço, sem melancolias, graças ao girassol que compreendi, uma tarde, na minha meninice.

Um girassol como qualquer outro, mas que emprestava sua mensagem, seu milagre. Nasceu em meio à inveja e à indiferença das outras flores do jardim, cresceu, adaptou-se às intempéries, aos parasitas sobre seu delgado caule. E morreu quando chegou o momento de. Simplesmente...

Em todas essas fases, entretanto, ele sempre procurava, sempre buscava o sol, a luz maior. Oferecia-se, por ele ansiava. Esquecia-se do seu verde mundo porque o que procurava estava além do naturalmente sobreviver. Nascera para ser fiel ao sol, ser seu humilde reflexo, sua lembrança na terra. Tranqüilo murchou sua vestimenta, certeza de missão cumprida.

Com e como o girassol, cativou-me o sol, e por decorrência, a grandeza da obra de Deus.

Cada obstáculo transposto, me torno mais forte. Quando me enfraqueço, cultivo esperanças, eis que olho mais para o alto, para o mais adiante, e ELE, imaginariamente descendo, acomoda-se no meu peito, torna-se o companheiro invisível, pairando não só sobre minhas indecisões como também sobre ressurgidas alegrias.

E permaneço, pois.

Teimosa e indefinidamente.

Porque imprevisível é nosso amanhã...
 


(22 de maio/2010)
CooJornal no 685


Milton Ximenes é cronista, contista e poeta
RJ

miltonxili@gmail.com

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