28/11/2008
Ano 12 - Número 609


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




VISÃO CRÍTICA DA HISTÓRIA



 

Existem livros cujo conteúdo ultrapassa o próprio título, mesmo porque a titulação de uma obra é questão difícil e nem sempre se obtém algum que retrate com fidelidade o que vai nas suas páginas. À primeira vista, “O cristianismo e o bezerro de ouro”, de Anselmo F. Amaral (Martins Livreiro Editor – P. Alegre – 2007) pode parecer obra panfletária de nome chamativo e chocante, mas na realidade isso não acontece. É, na verdade, um manual de história universal com exposição segura e que submete fatos e personagens ao crivo de uma crítica penetrante e arguta, em tudo diferente dos manuais congêneres, mostrando sempre as duas faces da mesma moeda. Para a realização desse trabalho contribuiu a evidente cultura humanística do Autor e sua sensibilidade no trato dos acontecimentos que comenta. A copiosa bibliografia em que lastreia as conclusões revela um pesquisador atento que vai rebuscar editoras e bibliotecas importantes à procura de livros nem sempre ao alcance da mão, alguns quase inacessíveis. Entre os autores que valoriza, deparei com surpresa com o historiador inglês H. G. Wells, pouco estudado entre nós e pelo qual também tenho simpatia. É a preocupação de um pesquisador que não se satisfaz com o fácil. Tudo isso contribuiu para fazer de seu livro um trabalho de leitura agradável, apesar de abordar tantas vezes temas áridos e espinhosos, levando o leitor a recapitular e aprender.

Palmilhando os caminhos tortuosos da história humana, desde os primórdios, ele se depara sempre com três fatores que foram constantes e provocaram indescritíveis sofrimentos, em especial para os mais pobres dos seres humanos: a guerra, a escravidão e a concentração da terra. Mostra, com base em fundadas fontes, que a opulência das nações e das minorias privilegiadas, em qualquer regime, se sustentava à custa da força do braço escravo, aviltando o trabalho, considerado atividade inferior, e com os pensadores formulando justificativas para preservar a odiosa situação. Assim, Varrão dizia o seguinte: “Escravo – instrumento com voz; boi – instrumento semi-vocal; coisa – instrumento mudo.” Nem mesmo o grande Aristóteles escapava à regra, afirmando: “O escravo é um utensílio dotado de vida e um utensílio é um escravo sem vida” (p. 11). Escravos eram os infelizes assim nascidos e seus descendentes e os vencidos, escravizados nas constantes guerras de conquista.

As guerras estão entre os maiores flagelos da humanidade e têm acontecido com tal freqüência que são encaradas com frieza e naturalidade. Segundo levantamento do Autor, Roma esteve envolvida em 31 guerras, sem falar na perene opressão armada contra as próprias massas para conter suas reivindicações (p.35). Quanto à Grécia, poderia ser descrita como uma sucessão de guerras: 14 conflitos, alguns de longa duração (p.12). E as guerras acompanham o homem e sua história, maiores e menores, revoluções, tumultos, embates, golpes, pela Idade Média a dentro e até os tempos modernos com as maiores carnificinas de que se tem notícia: as duas guerras mundiais (1914/1918 e 1939/1945). Além das guerras promovidas pela Inglaterra, pela França, pelos Estados Unidos e outros países, algumas típicas invasões de nações indefesas e sem reação.

E permeando tudo, a posse da terra nas mãos de poucos, com exclusão da maioria, a causa histórica que provocou sempre sangrentos conflitos em todos os cantos do mundo e ainda hoje não encontrou solução adequada.

Essas são apenas algumas notas sobre o livro de Anselmo F. Amaral, um chamado à consciência das pessoas em busca de um mundo de paz em benefício de todos. São lições que precisam ser aprendidas, expostas por um escritor que se debruçou sobre a história humana e soube captar os fatos com aquela visão crítica que permite enxergar com clareza.


 
(28 de novembro/2008)
CooJornal no 609


Enéas Athanázio,
jurista e escritor
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

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