20/01/2007
Ano 10 - Número 512


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio


 

NÓS E A AMAZÔNIA
 

Neste meu contínuo intercâmbio literário recebo livros e publicações de todos os cantos, inclusive da Amazônia. Lendo estes últimos, venho observando com preocupação que cresce naquela região, em especial no Pará, um sentimento coletivo hostil a todos nós - os sulistas. Em alguns textos e manifestações é perceptível a formação de ódio generalizado contra nós, considerados os causadores maiores das desgraças que por lá ocorrem, entre elas os desequilíbrios ecológicos que provocam estiagens nunca vistas e inundações dramáticas. Na raiz desses males, e de outros decorrentes, estaria a incessante derrubada das florestas, em ritmo frenético, sem qualquer limite, levada a cabo por gente do sul e do centro-oeste que para lá acorre em massa. O médico paraense Camillo Viana, dirigente de uma ONG, escreveu em recente artigo de jornal que “há uma diferença entre o nordestino, principalmente o cearense, e os centro-sulistas que vieram agora. Os primeiros realmente preservaram a floresta, os centro-sulistas não. Eles vieram para arrebentar tudo o que tiver pela frente.” Essa pregação não é de hoje, mas começa a surtir efeito. Na marcha em que vão as coisas, é bem possível que sejamos hostilizados naquela região pelo simples fato de sermos do sul.

O sentimento que fermenta por lá contra nós é injusto? Sem dúvida é, quando generalizado. Mas, bem observadas as coisas, veremos que não é destituído de razão. Em minhas andanças por aquela região, anos atrás, fiquei chocado com o desmatamento realizado sem critério, como já escrevi aqui. Em muitos lugares queimaram a floresta em pé, nem mesmo se dando o trabalho de derrubar as árvores, provocando fogueiras gigantescas que tudo destruíram. Troncos carbonizados permanecem em pé, em largas extensões, sem aproveitamento e com resultado pífio: as campinas são de más pastagens e o gado sem qualidade. Pelos nomes que ouvi e li, os autores da façanha são descendentes ou aparentados dos que devastaram por aqui, muitos deles bem conhecidos. É claro que atitudes dessa ordem só podem provocar reações negativas.

Essa devastação violenta sempre tem sido feita em nome do progresso, palavra mágica que tudo justifica. Mas se olharmos a História – é para isso que ela serve – aprenderemos uma dolorida lição: a agressão ao meio ambiente destruiu e pouco construiu. Bem próximo de nós existe um exemplo chocante: a célebre Companhia Lumber derrubou milhões de árvores nas regiões de Três Barras e Calmon e não deixou absolutamente nada, exceto os montes de serragem e os...aleijados de serrarias. Nem uma estrada, um hospital, uma escola, um melhoramento urbano. Os municípios ali criados, mais tarde, lutam com todas as dificuldades numa região empobrecida e descapitalizada porque seu maior recurso econômico – a madeira – foi carreado para fora e nada deixou atrás de si. Muitos outros exemplos, tanto aqui no Estado, como na região sul, poderiam ser citados.

Por essas e outras, a devastação crescente da Amazônia é preocupante pelas conseqüências e a fermentação de ódio contra nós é um fator negativo para a integração e a unidade nacional. Ódio entre regiões da mesma pátria nunca deu bom resultado, como o panorama mundial recente está farto de demonstrar.




(20 de janeiro/2007)
CooJornal no 512


Enéas Athanázio,
escritor e Promotor da Justiça catarinense (aposentado)
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC