15/07/2017
Ano 20 - Número 1.037

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CARLOS TRIGUEIRO

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Carlos Trigueiro



Conversa vem, conversa vai...

Carlos Trigueiro - CooJornal

Continuação da entrevista à Oleg Almeida publicada nas Revistas digitais: “EisFluências”  (Ano V, nº XXX,  Lisboa/Portugal e Recife/Brasil, agosto/2014),  GERMINA/Literatura (Volume 10, nº 2, agosto/2014, Brasil), RIOTOTAL (Ano 18, nº 913, Nov. 2014, Brasil) e no BLOG do GALENO, 2014.
(continuação)

 

OA: De 1980 a 1996 você morou no exterior. O que resultou da sua passagem por países tão dessemelhantes como a Itália e a China: a evolução de sua obra para o lado cosmopolita ou, quem sabe, a redescoberta do Brasil visto, de longe, com outros olhos?

CT: Já havia estudado em Roma (Itália) no biênio 1973/74, como bolsista metade do Banco do Brasil e metade do Governo italiano. Depois, entre 1980 e 1996, vivi e trabalhei em Madri (Espanha), Roma (Itália), Macau (China) e Chicago (EUA). Foram experiências notáveis, inclusive porque o primeiro impacto pessoal que sofri entre culturas tão diversas, apesar de ter algum conhecimento técnico, foi o reconhecimento da minha ignorância artística, musical, histórica e mesmo literária. A oportunidade de pisar em solos históricos da Europa e do Oriente, de visitar museus como o Prado, o Louvre, o Vaticano, a Academia de Artes de Florença, o Instituto de Arte de Chicago, ou caminhar sobre as ruínas milenares do império romano, reviver a hegemonia ibérica medieval, e sentir a milenar cultura chinesa nas crendices do dia a dia. Assim, no plano literário, acho que, para um espírito observador, seria inevitável adquirir uma visão cosmopolita da aventura humana. Claro que tudo isso me proporcionou comparações com a cultura brasileira e, depois, transpareceu direta ou indiretamente nos meus textos.

OA: Quem é Carlos Trigueiro antes de tudo: contista de Confissões de um anjo da guarda ou romancista de Libido aos pedaços? Qual é seu gênero preferido?

CT: Penso que sou os dois, ou até mais que isso, pois ainda me arrisco na poesia, tendo alguns poeminhas publicados em coletâneas brasileiras e portuguesas. De todo modo, eu fico mais à vontade na brevidade do conto.

OA: Diversos críticos percebem nos seus textos, onde os entes sobrenaturais atuam ao lado das pessoas comuns, traços característicos do dito realismo fantástico. Você concorda com eles? Ou talvez esteja contra todos aqueles rótulos que se costuma pôr em obras de ficção e seus autores?

CT: Gosto do chamado “realismo fantástico”. Tem a ver com os meus devaneios, com as minhas experiências de vida em várias culturas e mundos diferentes, e, sobretudo, com a constatação da nossa fragilidade humana impressionável, de natureza misteriosa aqui e corruptível ali, inconformada com a nossa infelicidade metafísica, com a consciência da mortalidade da carne – no dizer de Sábato – e de sermos meros figurantes – insignificantes e infinitesimais – soprados e levados pela poeira cósmica.

OA: Seus livros parecem bem diferentes entre si no que diz respeito ao conteúdo e, não raro, à construção estilística. Há, todavia, um tema principal, uma ideia abrangente que os perpassa, uma espécie de “marca registrada” de Carlos Trigueiro?

CT: Meus livros são mesmo diferentes um do outro, ainda que o estilo seja aqui e ali mais ou menos identificável. Na trilogia da feiura, com O Clube dos Feios (feiura estética), O Livro dos Ciúmes (feiura sentimental) e O Livro dos Desmandamentos (feiura social e política do Brasil) esse aspecto apareceu claro ao crítico e poeta Ivo Barroso, por exemplo, que identificou nessas obras um fio condutor, ou seja, “o corte visceral das misérias humanas”. Por outro lado, o crítico, escritor, ator e cineasta W. J. Solha identifica na minha obra certo espírito “machadiano” quanto ao estilo irônico e repetitivo de palavras na feitura de alguns textos. O poeta e crítico Affonso Romano de Sant’Anna registrou densidade poética nos meus textos, bem como uma carga dramatúrgica nos meus romances. Já a professora Monica Rector – da Universidade da Carolina do Norte / EUA – em um longo ensaio na Revista TALLER DE LETRAS, da PUC de Santiago/Chile – diz que meus contos em O Clube dos Feios parecem parábolas, têm conteúdo moral e revelam a universalidade dos sentimentos do homem.

OA: Em 1995 seu livro O clube dos feios e outras histórias extraordinárias entrou no catálogo da distribuidora nova-iorquina Luso-Brazilian Books, espalhando-se, a partir dali, pelas universidades e bibliotecas dos Estados Unidos. Foi um verdadeiro salto qualitativo ou apenas uma daquelas oportunidades fortuitas que o fado nos oferece de vez em quando?

CT: Acho que foi um desguio do destino. De repente, o livro foi parar em várias bibliotecas universitárias norte-americanas, talvez pelo título, talvez pelo conteúdo de “histórias extraordinárias”, talvez porque professores brasileiros de Literatura latina em universidades americanas conheciam bem o livro e alguns também o autor. E o conto O Clube dos feios foi tema de palestras em universidades. O conto Associação dos indivíduos de apelido Cheong, por exemplo, foi publicado na revista literária “The America’s Review” da Universidade de Houston (Texas), com tradução para o espanhol pelo editor, na época, Mario Flores.
Também me impressionou o interesse norte-americano quanto ao O Livro dos Desmandamentos que passou a constar do acervo da Biblioteca do Congresso dos EUA, e, ali, ter uma resenha oficial que diz sobre a obra: “importante ferramenta não oficial para entender a realidade sociocultural e política do Brasil”. Mais tarde, a Revista literária METAMORPHOSES, periódico do Smith College da Universidade de Massachusetts, publicou capítulos agrupados do mesmo livro e com tradução de Clay Resnick.



(Continua...)



Extraído do livro "HISTÓRIAS TIPO ASSIM: WHATS-au-au-APP",
selo IMPRIMATUR, Ed. 7Letras.

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Comentários sobre o texto podem ser encaminhados ao autor, no email
carlostrigueiro@globo.com


(15 de julho/2017)
CooJornal nº 1.037


Carlos Trigueiro é escritor e poeta
Pós-graduado em "Disciplinas Bancárias".
Prêmio Malba Tahan (1999), categoria contos, da Academia Carioca de Letras/União Brasileira de Escritores para “O Livro dos Ciúmes” (Editora Record), bem como o Prêmio Adonias Filho (2000), categoria romance, para “O Livro dos Desmandamentos” (Editora Bertrand Brasil). RJ
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