01/06/2022
Ano 25
Semana 1.274

 




Arquivo

Conversa

com o paciente



 

 


 

O binômio médico-paciente

 


Pedro Franco



A consulta terminou, o cliente saiu e o médico com a impressão de que, na consulta, algo aconteceu que impedirá a volta do paciente. Porém, foi consultado com atenção, examinado segundo a melhor técnica, medicado de acordo com a mais apurada terapêutica e três exames necessários foram solicitados. Não houve rusgas durante o exame, mas o enfermo não voltará, diz-lhe a experiência médica de anos e anos, sensação esta confirmada pelo tempo, em muitos casos. Em outras ocasiões a primeira consulta é a impressão de relacionamento antigo, de casamento técnico perfeito, um conjunto harmônico que vai frutificar em benefício do paciente, na melhora de seu estado de saúde, por toda a vida.

Esta constatação se faz em todos os níveis, desde a Medicina Previdenciária até na Clínica mais sofisticada e passando também pelo atendimento universitário a indigentes. Logicamente que o relacionamento, bom ou mal, bases maiores para explicar esta atração técnica, ou o desagrado pessoal, acontecerá mais nos consultórios particulares, onde as peculiaridades do local e o fator tempo ajudam, ou prejudicam, as afinidades entre médicos e pacientes. Li, certa vez, que, em determinado país europeu, excetuando-se as situações de emergência, o médico pode recusar o cliente, face a antipatia. Esta conduta choca aos que fizeram o juramento hipocrático e se moldaram na escola do servir, ser útil da melhor e indistinta forma. Mas, quando se penetra na profissão e em suas dificuldades, pensa-se duas vezes antes de condenar irrestritamente o referido código de ética, francês, se não me falha a memória, Pois, na prática, percebe-se que deve haver um misto de respeito, hierarquia, amizade, confiança técnica-pessoal e obediência na relação paciente com o médico, que, dentro dos limites funcionais, deve ser mantida também em sentido contrário, do médico para com o paciente. De forma meio indefinida poderíamos dizer que deve haver calor humano no trato médico-paciente, paciente-médico. Contou-me um sábio e aposentado colega, também médico da Caixa Econômica, que seu pai, clínico tarimbado e mordaz, dizia que “os porcos se juntam pelo ronco”. Diria eu, que nós nos agrupamos e nos inter-relacionamos pelas nossas afinidades. A cultura do médico e a do paciente, e talvez devesse, ao invés de cultura, usar o termo vivência, para apelidar o cabedal de experiência de vida dos componentes do binômio, é importante para a solidificação do inter-relacionamento. Poderia exemplificar com a figura, lamentavelmente em extinção, do médico de família, onde o carinho presidia o relacionamento profissional.

Para retirar deste artigo o ar de ensaio, que não pretendo fazer, termino com um pensamento e um conselho, sabendo já que o primeiro pode parecer pretencioso e o segundo peca pelo título: conselho. O primeiro, a Medicina precisa ter bases científicas, mas é arte, e esta relação entre médico e paciente precisa ter bases científicas definidas, porém o que pesa mesmo é a arte individual dos envolvidos e, às vezes, por causas ainda desconhecidas, os dois não se cruzam. Cheguei lá, os dois não se cruzam! O conselho aí vai: procurem ter um médico assistente e, principalmente, procurem se “cruzar” com este médico. O perfeito e harmônico funcionamento do binômio ajuda muito nas horas tristes e sérias das enfermidades graves.



Pedro Franco é médico cardiologista
RJ
pdaf35@gmail.com

 

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Direção e Editoria
Irene Serra