01/06/2022
Ano 25
Semana 1.274

 




Arquivo

Conversa

com o paciente



 

 


 

Deontologia médica


Pedro Franco



Existe em Medicina um setor de difícil entendimento para alguns leigos e a incompreensão existe porque o assunto não se prende à parte científica da matéria e sim às relações entre os próprios médicos e entre médicos e doentes, relacionando ainda obrigações morais e legais. Refiro-me à Deontologia Médica, regida por um Código de Ética Médica.
Sempre que os pacientes, ou seus familiares, se reportam a asta coleção de normas, fazem-no depreciativamente, pois encaram os citados princípios apenas como uma proteção à classe médica, contrariando sempre os sagrados direitos dos enfermos, resguardando apenas os dos médicos, sem se incomodarem com a verdadeira finalidade da Medicina — o doente. E justamente a Ética Médica tem por objetivo salvaguardar a Medicina, para que ela em toda a sua pujança, e com todos seus recursos, possa lutar por restabelecer a saúde, mitigar padecimentos, ou prevenir moléstias. E os poucos facultativos, transfugas das leis de conduta profissional, põem em risco não só a vida do doente, mas a verdadeira fé no da Ciência, que os pacientes necessitam possuir. Como poder admitir que os seguidores de uma mesma carreira se acusem indiscriminadamente de incompetência em tão difícil ofício, ou anunciem curas sabidamente impossíveis, enfim, não agindo com o decoro, que o mister exige?

Poucos assuntos se tornam tão difíceis nos consultórios como os problemas deontológicos, quer pela desobediência, rara e eventual, de uns poucos facultativos, ávidos de conseguirem clientela, não evitando para isto expedientes menos aconselháveis, quer pelo total desconhecimento, por parte dos enfermos e familiares, da conduta que deve ser obedecida pela classe. Há que treinar a autocrítica e domínio, para evitar sempre comentários levianos, que viriam conspurcar o segredo médico. Quantas intervenções indevidas, ou inadequadas, por falta e esclarecimentos, nos propõem os donos dos doentes, principalmente nos casos desesperadores. Por exemplo, solicitam que um médico policie o tratamento prescrito por um outro, sem que o assistente tome conhecimento do fato, como se isto fosse possível, ou contribuísse para o restabelecimento do paciente! O próprio Código de Ética encontra, para esta e outras situações, uma solução que permite o diálogo entre os médicos, franco e saudável, em conferência médica, permitindo encontrar, entre vários caminhos, o mais adaptável ao caso. Esta forma de agir evita expedientes escusos, que diminuiriam ambos os profissionais, perante a família aflita, para não nos reportarmos aos óbices decorrentes de orientações quiçá antagônicas e conflitantes. Caso os colegas acedessem aos desígnios dos parentes conturbados, limitaram os burrinhos de anedota, que amarrados pela mesma corda, tentavam ir comer em montes de feno opostos, sem conseguirem.

A atriz Marlene Dietrich afirmou, em suas memórias, acertadamente, que as pessoas escolhem os mecânicos de automóveis com mais cuidado do que seus médicos. E pior, constato, famílias inteiras vivem sem um médico assistente. Aquela escolha sem maiores pesquisas ou interesse, se torna campo fértil para futuras desconfianças nas horas graves das doenças. E, problemas éticos e incertezas não existiriam, se a se solidificado entre médico e doente, no correr das consultas rotineiras, sempre úteis para a profilaxia das enfermidades.

Finalizamos, lembrando que, se o Código de Ética deve ser obedecido fielmente pelos médicos, os leigos podem ter absoluta certeza de que este Código não é um manto destinado a servir de desculpa para certos atos e sim um conjunto de regras, como é a Moral para a Sociedade, que visa amenizar o contato entre os interessados e sobretudo preservar, em todos as sentidos, esta Ciência-Arte, árdua e sempre em evolução, a Medicina, tão importante, quão incompreendida.



Pedro Franco é médico cardiologista
RJ
pdaf35@gmail.com

 

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Direção e Editoria
Irene Serra