Ano 23 - Semana 1.161 

 
ARQUIVO de MÚSICA




01 de fevereiro, 2020

SÉRIE "ENCONTROS HISTÓRICOS NA MPB" (2):

Nana Caymmi & Cesar Camargo Mariano

 

 
Cândido de Lima Fernandes


Um dos mais belos discos da MPB é “Voz e Suor”, gravado em 1983, tendo ao piano o músico e arranjador Cesar Camargo Mariano e, como intérprete, a maravilhosa cantora Nana Caymmi.

Nana Caymmi é o nome artístico de Dinair Tostes Caymmi, nascida no Río de Janeiro em 29 de abril de 1941. Filha de Dorival Caymmi e Stella Maris e, portanto, irmã de Danilo e Dori Caymmi, Nana cresceu em uma das famílias mais musicais do Brasil. Começou a cantar desde muito jovem, adotando desde então uma técnica vocal muito particular, em que aprendeu a enfatizar seu timbre grave. Em 1961 participou de um concurso cantando uma música de autoria de seu pai, "Acalanto". Pouco tempo depois, mudou-se com seu marido para a Venezuela, passando alguns anos afastada do meio artístico.

De volta ao Brasil, lançou seu primeiro disco, "Nana". Em 1966, participou do I Festival Internacional da Canção, obtendo o primeiro lugar com a canção "Saveiros", de Dori Caymmi e Nelson Motta. Fora do Brasil, trabalhou com Sarah Vaughan e Sérgio Mendes. Nos anos 70 e 80 gravou vários discos como solista e alguns outros em parceria, como é o caso de "Voz e Suor" (1983), junto ao pianista, compositor e arranjador Cesar Camargo Mariano.

Na década de 1990, chegou às listas dos discos mais vendidos por dedicar-se à interpretação de canções românticas e boleros, sendo "A Noite do Meu Bem" e "Resposta ao Tempo" dois de seus trabalhos mais populares. No ano de 1993 editou "Boleros", uma seleção de 14 boleros clássicos, 13 deles cantados em castelhano.

Em 2003, lançou "Duetos", um álbum que traz uma seleção de canções, em parceria com artistas consagrados da música popular brasileira, como Emílio Santiago, Herbert Vianna, Agnaldo Timóteo e Beth Carvalho, entre outros. Depois de "Duetos", Nana fez uma pausa em sua atividade musical para dedicar-se a um projeto com a família Caymmi.

Em 2004, junto aos irmãos Danilo e Dori, lançou "Para Caymmi, de Nana, Dori e Danilo: 90 anos", para celebrar o nonagésimo aniversário de seu pai, Dorival Caymmi. O disco deu origem a um DVD homônimo. Em "Até Pensei...", de 2005, a cantora ofereceu a seu público uma nova coleção de canções românticas e boleros.

Como já escrevemos em crônica anterior, em 2019 lançou “Nana Caymmi canta Tito Madi”, uma homenagem a Chauki Maddi (12 de julho de 1929 – 26 de setembro de 2018), compositor, cantor e pianista paulista que mergulhou com sofisticação no universo da chamada “música de fossa”, das dores de amor do samba-canção.

Cesar Camargo Mariano é um pianista, arranjador, produtor musical e compositor brasileiro, nascido a 19 de setembro de 1943, em São Paulo. Sua carreira começou em junho de 1957, com apenas 14 anos de idade. Nesta época, a trombonista norte-americana Melba Liston o convidou para participar de seu concerto em um clube de jazz no Río de Janeiro. Neste mesmo ano, Cesar Camargo Mariano conheceu o pianista Johnny Alf (falecido em 2010), que o convidou para morar em sua casa em São Paulo com ele e sua família. Johnny Alf ensinou a Cesar Camargo os segredos do arranjo, da composição e das artes do cinema e do teatro.

Seu primeiro emprego como profissional foi com a orquestra de William Furneaux e, pouco depois dessa experiência, em 1962, formou sua primeira banda, “Três Américas”, que tocava em festas e bailes. Cesar Camargo estudou teoria musical com seu pai, maestro de música, mas nunca se converteu em um músico acadêmico. Após dois anos de tentativas e fracassos decidiu continuar tocando de ouvido.

Em 1963 integrou o Quarteto Sabá, com o qual gravou seu primeiro LP. Em seguida formou o Sambalanço Trio, com Airto Moreira e Humberto Claiber. Juntos gravaram um disco com Lennie Dale, que lhes concedeu vários prêmios e, sobretudo, reconhecimento. Ao final dessa mesma década, a rede TV Record de São Paulo o convidou para participar de um especial chamado "Passaporte para o Estrelato". A partir dessa experiência a emissora decidiu contratá-lo para trabalhar como instrumentista e arranjador. Seus dois grupos dessa época, Sambalanço Trio e Som Três, são considerados uma importante contribuição dentro do jazz brasileiro. De fato, “Samambaia” (1981), foi um de seus álbuns mais populares tanto no Brasil como nos Estados Unidos.

Uma de suas parcerias mais conhecidas é “Elis e Tom” (1973), feito juntamente com Elis Regina e Tom Jobim. Como mostramos na crônica do mês passado, este álbum consagrou Cesar Camargo Mariano de forma definitiva como produtor, pianista e diretor musical, considerado por parte da crítica especializada como um dos melhores discos da bossa nova. Também participou de alguns álbuns junto com Chico Buarque, Maria Bethânia e Jorge Ben. Na mesma época, entrou no mercado dos jingles e no das bandas sonoras de cinema.

Nos anos oitenta Cesar Camargo Mariano gravou dois discos considerados históricos, o citado “Samambaia”, junto com o guitarrista Hélio Delmiro, e "Voz e Suor", nosso disco de hoje, junto com Nana Caymmi.

Precursor no uso de sintetizadores em seus arranjos musicais, Cesar Camargo continuou atuando como arranjador, produtor, compositor e pianista no Brasil até 1994, data em que se mudou para os Estados Unidos, onde começou a trabalhar com o saxofonista e compositor japonês Sadao Watanabe, a quem acompanhou em suas habituais turnês pelo Japão.

Cesar Camargo Mariano é pai de quatro filhos, todos eles músicos. O mais velho é o baixista Marcelo Mariano, fruto de seu primeiro casamento com a cantora brasileira Marisa Gata Mansa. Seu enlace seguinte foi com nada menos que a diva Elis Regina. O casamento durou oito anos, durante os quais nasceram a cantora Maria Rita e o também cantor Pedro Camargo. Sua filha mais nova é Luísa Camargo, fruto de sua união com Flavia Rodrigues Alves.

“Voz e Suor”, gravado no ano de 1983, é um daqueles trabalhos que devem ser saboreados aos poucos. O álbum está recheado de grandes temas, alguns dos quais de autoria de compositores do quilate de Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Dorival Caymmi, Ivan Lins e Milton Nascimento, aos quais a voz de Nana e os arranjos e o suave toque pianístico de Camargo conseguem conferir uma dimensão diferente das interpretações tradicionais. São maravilhosas as interpretações de “Doce Presença” (Ivan Lins e Vitor Martins), “Clara Paixão” (Rosinha de Valença, Indy e Nonato Buzar) e ”Velho Piano” (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro). Estou certo também de que “Fruta Boa” (Milton Nascimento e Fernando Brant) e “Por Toda a Minha Vida” (Tom Jobim e Vinicius de Moraes) conseguirão emocioná-los.

Este é um trabalho precioso, daqueles que recomendamos de coração e que, infelizmente, não é facilmente encontrado no mercado, apesar dos nomes de seus protagonistas, autênticos ícones da música popular brasileira. Porém, pode ser encontrado nas plataformas digitais, como o Spotify.

Espero que vocês gostem.

Cândido Luiz de Lima Fernandes é
economista e professor universitário em Belo Horizonte;
email:
candidofernandes@hotmail.com






 

Direção e Editoria
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