Ano 23 - Semana 1.153 

 
ARQUIVO de MÚSICA




16 de dezembro, 2019

VENDEDOR DE SONHOS: o novo álbum com

composições de Fernando Brant

 

 
Cândido de Lima Fernandes


Um bom presente de Natal nos é proporcionado pela Biscoito Fino com o álbum “Vendedor de sonhos”, que acaba de chegar às plataformas digitais. Este álbum foi produzido e idealizado por Robertinho Brant, sobrinho do letrista, que morreu em 2015. O lançamento do CD físico está marcado para 17 de dezembro, no Rio de Janeiro, com “pocket show” de Tadeu Franco.

O álbum traz 20 canções com letras de Fernando Brant, uma boa parte delas em parceria com Milton Nascimento e representa um verdadeiro mutirão afetivo: 25 cantores participaram do disco – de companheiros do Clube da Esquina a novas vozes da MPB. Além de, naturalmente, o próprio Milton, destacam-se as participações de Beto Guedes, Toninho Horta, Lô Borges, Tavinho Moura, Flávio Venturini, Tadeu Franco, ao lado de outros consagrados como Djavan, Joyce, Dori Caymmi, Zé Renato, Mônica Salmaso, chegando aos mais jovens Samuel Rosa, Roberta Sá, Fernanda Takai, entre outros.

Sobre o álbum, Milton Nascimento, o parceiro maior e mais frequente de Fernando Brant, declarou ao jornal Estado de Minas: “Muito legal saber que esse material finalmente ganhou o mundo. Fernando Brant teve uma vida grandiosa, sua obra é imortal. E não podemos parar por aí. Fernando Brant é o Brasil, a gente jamais deve se esquecer disso”.

“Vendedor de Sonhos” é, de fato, um trabalho muito lindo. Fazendo uma clara opção por versões mais suaves, abriga canções maravilhosas pinçadas entra as 320 compostas por Brant, sendo 110 delas com Milton.

A primeira faixa nos apresenta Beto Guedes de volta, interpretando “San Vicente” (parceria com Milton Nascimento), com um belo instrumental e um tom mais baixo.

A seguir, vem “Credo” (parceria com Milton Nascimento), com uma linda interpretação do grupo Boca Livre.

Logo após, temos “O medo de amar é o medo de ser livre” (parceria com Beto Guedes), aqui gravada pela primeira vez por Milton.

A quarta faixa nos apresenta ”O que foi feito deverá (de Vera)” (parceria com Milton Nascimento), que ganhou o toque delicado e intenso na bela voz de Mônica Salmaso. Nas palavras de Mônica, “ela é muito linda, forte, uma canção que ouço desde criança. É uma felicidade fazer parte desse projeto.

Neste momento, a gente precisa reafirmar o tempo todo e o máximo possível o valor da nossa história, da nossa cultura e da nossa identidade. A obra do Fernando Brant tem a ver com isso. Esta música, especialmente, é muito atual.”

Na quinta faixa, “Saudades dos aviões da Panair (Conversando no bar)” (parceria com Milton Nascimento), imortalizada nas vozes de Elis Regina e do próprio Milton, ganhou, na voz de Joyce, uma interpretação diferente, delicada, com muita sensibilidade.

Djavan entra na sexta faixa em “Milagre dos Peixes” (parceria com Milton Nascimento), com uma interpretação diferente, mais suave que a do próprio autor.

Dori Caymmi vem a seguir, com sua voz grave e possante, interpretando “Sentinela” (parceria com Milton Nascimento), clássico eternizado por sua irmã, Nana, e pelo próprio Milton. Esta é a única música do álbum cujo arranjo não foi feito por Robertinho Brant. Nas palavras de Dori, “Gravei em Los Angeles, só eu e meu violão, com o meu jeito. Tem um toque de tristeza, porque o Fernando havia acabado de partir. Quis colocar aquele sentimento ali. “Sentinela” é uma música linda, da fase criativa do Brasil. Dos mineiros, Fernando Brant era a pessoa mais próxima a mim, eu o admirava profundamente. Ele faz muita falta, ainda mais nestes tempos sombrios que o país e a cultura atravessam”. Foi com Dori que Fernando compôs sua última canção, “Serra do Espinhaço”.

A oitava faixa apresenta a bela “Outubro” (parceria com Milton Nascimento), com uma bonita interpretação de Nina Becker.

A nona faixa apresenta a primeira composição de Fernando com Milton, a linda “Travessia”, gravada por dezenas de cantores, na voz do guitarrista e compositor Toninho Horta, que aqui a interpreta de um modo que vai na contramão de todas as outras que existem da canção.

Vem, a seguir, “Ponta de Areia” (parceria com Milton Nascimento), imortalizada nas vozes de Elis, Nana e do próprio Milton, lindamente interpretada por Roberta Sá.

Lô Borges apresenta uma excelente interpretação de “Durango Kid” (parceria com Toninho Horta) na décima primeira faixa. Nas palavras do Lô, “Quis interpretar essa música não só por ser parceria com o Toninho, que adoro, mas porque o Fernando era o próprio Durango Kid. Ele costumava assinar cartas com esse pseudônimo. Fiquei muito feliz em participar da homenagem a esse cara genial da nossa música”.
Uma surpresa, na décima segunda faixa, é a possante voz de Seu Jorge, interpretando “Saídas e bandeiras nº 1” (parceria com Milton Nascimento).

Na décima terceira faixa, Fernanda Takai, com sua voz linda e suave, apresenta uma ótima interpretação de “Veveco, Panelas e Canelas” (parceria com Milton Nascimento), com destaque para os arranjos de metais. De acordo com Fernanda Takai, a faixa transmite “uma esperança com cara de liberdade”. Fernanda comenta ainda que “Ao mesmo tempo, a canção fala de coisas bem cotidianas. Meu pai tinha uma compilação em cassete de canções mineiras, e essa era uma de minhas preferidas. Ainda bem que pude ficar com ela. Curiosamente, a Mariana, filha do Veveco (o arquiteto Álvaro Hardy, inspirador da letra), tem feito as últimas capas de meus álbuns com sua equipe”.

Na décima quarta faixa, Samuel Rosa canta “Paisagem da janela” (parceria com Lô Borges), que considera obra-prima. Samuel diz que admira não só o compositor, mas o poeta e escritor Fernando Brant: “Brant tem uma escrita muito fácil, divertida e inteligente. E ajudou muito naquilo que foi o amálgama, a gênese da transformação da MPB.”

Tadeu Franco, que tem uma parceria com Fernando (“Musa”) e é dono de uma das mais belas vozes entre os cantores mineiros, apresenta, na décima quinta faixa, a impactante “Beco do Mota” (parceria com Milton Nascimento). Nas palavras de Tadeu Franco, “Uma das coisas que mais me marcaram em Fernando foi o fato de ser poeta dos maiores, mas nunca se comportar como tal. Como sou do Jequitinhonha (a canção fala de um lugar simbólico de Diamantina), a escolha não poderia ser melhor. Certa vez, o Fernando comentou que a melodia da introdução, lembrando canto gregoriano, foi feita por ele, algo raro num letrista. É uma obra forte, o arranjo ficou especial”.

A décima sexta faixa apresenta “Vida” (parceria com Milton Nascimento) é interpretada por uma das mais belas vozes masculinas do Brasil, a de Zé Renato, parceiro de Milton em “Ânima”. Já na décima sétima faixa, a canção “Amor amigo” (parceria com Milton Nascimento), é interpretada lindamente por Paula Santoro, uma voz que se destaca entre as cantoras mineiras.
“Canoa, canoa” (parceria com Nelson Ângelo) é interpretada, na décima oitava, faixa por Vander Lee, que morreu em 2016. Nas palavras de Vander Lee, “Fernando era uma espécie de Carlos Drummond dos letristas”.

Tavinho Moura, outro grande amigo de Fernando, interpreta, na décima nona faixa, “Maria três filhos” (parceria com Milton Nascimento). Segundo Tavinho, “Fernando é a melhor pessoa para nos representar em nossa luta pela poesia, pela música e pela literatura. Essa composição ficou muito marcada pelo Bituca, e eu adoro. Os arranjos do Robertinho deram o diferencial”.

Finalmente, a canção-título, “Vendedor de sonhos” (parceria com Milton Nascimento) é interpretada na última faixa por Flávio Venturini e Marina Machado. Robertinho Brant comenta que “Vendedor de sonhos” foi o primeiro nome dado à letra de “Travessia”.

Além de Robertinho Brant (arranjos, vocais e violão), as regravações das canções de Fernando Brant contaram com instrumentistas de primeira linha: Guilherme Monteiro e Pedro Martins nas guitarras, Rafael Vernet nos pianos e órgãos, Lincoln Cheib nas baterias, Marco Lobo nas percussões, Enéias Xavier nos baixos, Tattá Spalla nos violões e Jorge Continentino nos sopros.

Não deixem de escutar este belo presente de fim de ano. Os leitores certamente sentirão falta de “Canção da América” e “Nos bailes da vida”, ambas parcerias de Milton Nascimento com Fernando Brant. Robertinho comenta que estas canções já foram tão regravadas que valeria a pena privilegiar outras. De fato, a vasta obra de Fernando Brant traz inúmeras surpresas e possibilidades. Um feliz 2020 para todos vocês!


Cândido Luiz de Lima Fernandes é
economista e professor universitário em Belo Horizonte;
email:
candidofernandes@hotmail.com






 

Direção e Editoria
IRENE SERRA
irene@riototal.com.br