Ano 22 - Semana 1.149 

 
ARQUIVO de MÚSICA




16 de novembro, 2019

“Paraíso”: o novo álbum de

Flávio Venturini e do grupo DoContra

 
Cândido de Lima Fernandes


Flávio Venturini é um dos mais talentosos músicos e compositores mineiros. Começou a se interessar pela música na adolescência, quando ganhou um acordeon dos pais, depois trocado por um piano, seu principal instrumento. Ainda jovem, começou seus estudos de percepção musical e piano na Fundação de Educação Artística de Belo Horizonte. Mais tarde, aprimorou sua técnica, estudando composição e arranjo com Walter Smetak, Ernest Widmer, Bruno Kiefer, Ailton Escobar, Cláudia Cimbleris e Rogério Duprat.

O artista foi revelado nos anos 1970 pelo movimento Clube da Esquina, ao lado de Milton Nascimento, Lô Borges, Beto Guedes e outros compositores. Entre 1974 e 1979 integrou o grupo musical O Terço, antes de criar o grupo 14 Bis, que fez muito sucesso na década de 1980. Em 1989 saiu do grupo para seguir uma bem sucedida carreira solo, tendo feito shows em todo o país e se apresentado nos EUA, Canadá, Japão, Noruega, Espanha, Itália e Argentina. Flávio gravou 24 discos e 3 DVDs até 2019. No corrente ano lançou o CD “Paraíso”, com o grupo de contrabaixos DoContra, comandado pelo arranjador Neto Bellotto, encontrando-se em fase de gravação, seu disco “Paisagens Sonoras”, um projeto de dois álbuns com várias vertentes de seu trabalho.

Flávio Venturini construiu, em 45 anos de carreira, uma obra singular que promoveu a interseção entre a MPB, o rock – em especial, o de textura progressiva – e o som que podia ser caracterizado como pop brasileiro na década de 1970. Teve inúmeras canções incluídas em novelas de TV. Compôs trilhas para dança e cinema, entre elas a trilha do longa “As Mães de Chico Xavier”. Entre seus sucessos, destacam-se "Todo azul do mar", "Espanhola", "Céu de Santo Amaro", "Noites com sol", "Mais uma vez", "Nascente", "Besame", "Linda Juventude" e "Planeta Sonho".

Milton Nascimento, Beto Guedes, Renato Russo, Caetano Veloso, Maria Bethania, Simone, Leila Pinheiro, Ed Motta, Emilio Santiago, Alcione, Roupa Nova, Ney Matogrosso, Tito Madi, André Mehmari e MPB- 4 são alguns dos artistas da MPB que já interpretaram composições de Flávio Venturini e revelaram, assim, a sua força de melodista e versatilidade como compositor. No exterior, foi gravado por artistas como Pat Metheny, Michael Brecker, Denise Stewart, Lisa Nilson e Stefanie Lai.

Ao longo dos anos 80 e 90, consagrou-se com um dos grandes hitmakers brasileiros em álbuns como “Andarilho de Luz” (1984), “Cidade Veloz” (1990), “Noites com Sol” (1994), “Beija-Flor” (1996) e “Trem Azul” (1998). Além das melodias e harmonias elaboradas, sua marca é o canto suave e o lirismo contundente num universo de canções irresistíveis.

Em 2001 lançou o CD DVD “Linda Juventude”, que contou com as participações de Beto Guedes, Lô Borges, Paulinho Moska, Guinga, Marcus Vianna, Leila Pinheiro e Paulo Ricardo. Vieram a seguir os discos “Por que Não Tínhamos Bicicleta” (2003) e “Canção sem Fim” (2006), ambos por seu próprio selo, Trilhos Arte. Em 2009 lançou o DVD e CD ‘Não se Apague esta Noite’ com participações especiais de Mart’nália, Milton Nascimento, Toninho Horta, Nando Lauria, Marina Machado e Luiza Possi. Sempre se apresentando pelo Brasil e em festivais no exterior, Flavio Venturini lançou em 2013 seu CD ‘Venturini’, com 9 musicas inéditas e participação especial de Ivan Lins, mostrando várias tendências do seu rico universo de composição.

Aos 70 anos de vida, recém-completados em 23 de julho de 2019, o artista revisita seu cancioneiro de grande beleza melódica no álbum “Paraíso”, que conta com a participação do contrabaixista Neto Bellotto, também integrante da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, e de seu grupo DoContra, composto por seis contrabaixos. Na gravação do álbum “Paraíso”, feita em estúdio, o grupo DoContra ganhou outros instrumentos que o aproximaram do formato de sinfônica. No dia 24 de outubro assisti, no Expominas, em Belo Horizonte, a uma bela apresentação das músicas deste álbum de Flávio Venturini e do grupo DoContra, que contou ainda com a participação da Orquestra de Câmara Sesiminas, regida pelo maestro Marco Antônio Maia Drumond.

A primeira faixa de “Paraíso” é a inédita “Suíte Venturini” (de autoria de Neto Bellotto e Flávio Venturini), que é uma peça sinfônica composta com enxertos das melodias de músicas como “Nascente” e “Planeta Sonho” (de autoria de Flávio Venturini, Vermelho e Márcio Borges). Estas duas músicas também reaparecem no disco em versões cantadas.

A segunda faixa do disco é a belíssima “Céu de Santo Amaro”, versão do artista mineiro e de Caetano Veloso inspirada em Arioso Cantata 156, de Johann Sebastian Bach (1685 – 1750).

Na terceira faixa, o tango “Adiós nonino” (de Astor Piazzolla) se funde com a canção “Besame” (de autoria de Flávio Venturini e Murilo Antunes), cuja letra cita e evoca o som de um bandoneón. Destaque para a linda interpretação da cantora Bárbara Barcellos.

A seguir vem a belíssima “Nascente”, de autoria de Flávio Venturini e Murilo Antunes, imortalizada na voz de Milton Nascimento no álbum “Clube da Esquina 2, de 1978.

A quinta faixa é "Espanhola" (parceria com Guarabyra), canção lançada em 1977 nas vozes da dupla Sá & Guarabyra, mas popularizada somente nos anos 1980, como sucesso do repertório do grupo 14 Bis. O arranjo apresentado em “Paraíso” é imponente, contando com a participação do coral Madrigale, que remete ao canto gregoriano.

A sexta faixa, “Todo azul do mar” e a sétima, “Noites com sol”, são as composições de Flávio Venturini de que mais gosto.

A oitava faixa é “Criaturas da noite” (Flávio Venturini e Luiz Carlos Sá), que foi originalmente gravada no terceiro álbum da banda brasileira de rock progressivo O Terço, lançado em 1975.

As nona e décima faixas apresentam músicas até então conhecidas somente pelo público fiel do artista, casos de “Fotografia de um amor” (Flávio Venturini e Murilo Antunes), bela canção de lirismo romântico realçado pelas cordas do grupo DoContra e de “Belo Horizonte” (Flávio Venturini e Murilo Antunes), uma homenagem à cidade em que nasceu.

A décima primeira faixa, “Mais uma vez”, apresenta um novo arranjo para uma canção composta por Renato Russo e Flávio Venturini em 1986 e lançada como o primeiro single do álbum Sete, da banda 14 Bis, em 1987. Quando teve seu lançamento original, fez pouco sucesso. Porém, quando relançada apenas na voz de Renato Russo, em 2003, foi um grande hit no Brasil.

Nas décima segunda e décima terceira faixas, temos a recriação de antigos sucessos do 14 Bis, “Linda Juventude” e “Planeta Sonho”, que tanto marcaram bons tempos de nossas vidas.

Finalmente, na décima quarta faixa, a música-título “Paraíso” concretiza o desejo de Venturini em gravar as músicas de Ennio Morricone para a trilha sonora do filme “Cinema Paradiso”. Nas palavras de Venturini, “É uma trilha que emociona todo mundo. Juntamos dois temas do filme, com o poeta Murilo Antunes fazendo a letra para a primeira parte. Na segunda, canto em italiano, homenagem à origem da minha família.” Venturini aguardava a possibilidade de gravá-la desde 1994. Como na época não havia internet, o compositor não conseguiu contatar a editora para ter a autorização”.

De fato, este CD de Flávio Venturini e Grupo DoContra leva ao paraíso os ouvintes que sabem apreciar uma boa melodia e não deixa de ser um saboroso aperitivo para aguardar o álbum de músicas inéditas que o cantor e compositor prepara desde 2018 para ser lançado em 2020.


Cândido Luiz de Lima Fernandes é
economista e professor universitário em Belo Horizonte;
email:
candidofernandes@hotmail.com






 

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IRENE SERRA
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