01/09/2023
Ano 26
Semana 1.332




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História

Cultura

Tradição

 



Rosh Hashana

Uma Tradução Bem Diferente...


Jane Bishmacher de Glassman


Quando falamos em Rosh ha-Shaná, imediatamente pensamos no Ano Novo Judaico. Este não é um estudo acadêmico sobre a origem de festas de passagem do tempo ou da comemoração dos ciclos da natureza, envolvendo elementos arquetípicos universais... Só pretendo, como forma original de desejar Shaná Tová, repensar o significado da expressão.

Rosh, em hebraico, quer dizer cabeça. Mas significa também chefe; início, princípio; cimo, cume, vértice; parte, ramificação; base, fundamento, essência; veneno (planta venenosa); como adjetivo: superior, principal.
Shaná = ano. Mas (como verbo) significa também repetir, reiterar; estudar, aprender; ensinar, instruir; transformar-se, modificar-se; diferir.
Outra observação linguística interessante é que a palavra shaná é feminina...
Vejam o quanto podemos extrair em termos de reflexão sobre Rosh ha-Shaná só a partir do significado das palavras!

Quando falamos cabeça, tendemos a associar com razão, racional. Ao falar em feminino, associamos, até por condicionamento cultural, com o emocional. Tendemos a formar um binômio razão X emoção, bem como masculino X feminino...

Além disso, rosh pode ser base, início, parte ou cume: uma estrutura completa!

Quando pensamos em educação, a partir do hebraico shaná, recebemos um "toque" que pode nos ajudar a transformar as nossas vidas, fazendo um jogo com a multiplicidade de sentido destas palavras, que embutem mensagens valiosas: repetir ou transformar, estudar e aprender, ensinar instruir ou educar?

Dizer que Rosh ha-Shaná é um período de reflexão, é um lugar comum. Tornemos este lugar, este espaço temporal, um pouco mais incomum!

Usando os sinônimos mencionados, usemos há-rosh, a cabeça, a razão, para sermos o chefe... de nós mesmos, de nossos destinos! Não poderíamos assim entender o livre-arbítrio que nos foi dado por Deus? Não poderia ser esta a essência da mensagem metalingüística as palavras nos dizendo mais do que lhes é autorizado saber?

E nossa emoção? Não vem sempre carregada de um passado cumulativo que, se por um lado, engloba todas as nossas boas experiências, nossos afetos, nossas alegrias, por outro, também não nos faz carregar ao longo de nossas vidas, um amargo "lixo atômico" existencial de tristezas, frustrações, perdas, que tantas vezes contaminam nossa capacidade de (re)iniciar, de nos modificarmos, de nos transformarmos?

Assim como em Pessah fazemos uma faxina em nossas casas, para eliminar o hametz, devendo chegar ao hametz que fermenta vaidade e pensamentos negativos em nossos corações, aproveitemos Rosh ha-Shaná para fazermos uma faxina em nossas vidas aprendendo com nossos erros, buscando a transformação, agindo racionalmente, mas nos permitindo sentir, ensinando ao outro a paz, através do perdão, transformando veneno em essência!

Perdoemos, principalmente, a nós mesmos, pelas chances desperdiçadas, por ter perdido nossa auto-chefia na vida, recobrando-a, aprendendo com os outros e nós mesmos, para que fale mais alto o significado de diferir... enfim, para que Rosh ha-Shaná seja um real início, um princípio diferente!



Jane Bichmacher de Glasman é Doutora em Língua Hebraica, Literatura e Cultura Judaica - USP,
Professora Adjunta, Fundadora e ex-Diretora do Programa de Estudos Judaicos - UERJ
e do Setor de Hebraico UFRJ (aposentada) e UERJ, escritora

Publicado na Revista Rio Total em 9 de setembro, 2009




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Irene Serra