21/06/2008
Ano 11 - Número 586


Sheila Sacks
ARQUIVO

 

Sheila Sacks




CORAÇÃO DE ESTUDANTE

 

Em abril de 1985 uma tragédia marcou o cenário político brasileiro: Tancredo Neves, primeiro presidente civil eleito por um Colégio Eleitoral, depois dos chamados “anos de chumbo”, iniciados com o golpe militar de 1964, é enterrado sob forte comoção nacional na cidade mineira de São João Del-Rei. Hospitalizado às pressas na véspera da posse, o veterano político - que foi deputado federal por seis vezes, Primeiro-Ministro, senador, ministro da Justiça e governador de Minas – morreu de infecção generalizada, três meses depois de eleito e antes mesmo de assumir a presidência.

Em seu funeral, transmitido ao vivo pela TV para todo o país, uma melodia deu o tom e o clima emocionado de despedida. Tratava-se da composição predileta de Tancredo Neves, obra do compositor mineiro Milton Nascimento em parceria com Wagner Tiso, uma espécie de hino aos novos tempos de liberdade e justiça que assomavam no horizonte. Composta dois anos antes, em 1983, “Coração de Estudante” tornou-se a trilha sonora dos jovens que saíram das escolas, universidades e das organizações estudantis para as praças e avenidas de todo o país, estampando nas faces a esperança e o frescor do entusiasmo político que os transformaram em principais atores das “Diretas Já”, o movimento civil pelas eleições presidenciais livres que movimentou, com comícios e passeatas, o emblemático ano de 1984.

Anos depois, a musa e trovadora argentina Mercedes Sosa traduziu para toda a América Latina os inspirados versos da belíssima mensagem cantada pela garotada nas principais capitais do país: “Corazón de estudíante, hay que cuidar de la vida, hay que cuidar de este mundo, comprender a los amigos, alegría y muchos sueños, iluminando los caminos. Verdes, planta y sentimiento, hoja, corazón, juventud y fe.”

O NETO

Duas décadas depois, já no século XXI, uma venturosa coincidência traz o neto de Tancredo Neves – Aécio Neves, atual governador do Estado de Minas Gerais como foi o avô - ao solo sagrado de Israel. Foi em novembro de 2007, justamente no mês em que se comemorava os 60 anos da histórica decisão das Nações Unidas que reconheceu o direito dos judeus a sua terra milenar.

Naquele ano de 1947 um brasileiro presidiu a 2ª Assembléia da ONU tornando-se peça decisiva na aprovação do documento. Diplomata e estadista, o gaúcho Oswaldo Aranha era o chefe da delegação brasileira na recém-criada Organização das Nações Unidas. Antes, representou o país em Washington, na década de 30, sendo amigo pessoal do presidente Roosevelt. Com uma atuação marcante na vida política nacional, anos mais tarde foi companheiro de ministério de Tancredo Neves no segundo governo Getúlio Vargas (1951-1954), exercendo o cargo de ministro da Fazenda enquanto Tancredo era ministro da Justiça.

O POLÍTICO

O jovem Aécio Neves, 48 anos, traz de berço o matiz democrático que caracterizou o comportamento e as ações de Tancredo Neves. Ele começou cedo na política, aos 22 anos, como secretário particular do avô. Ao assumir o governo de Minas pela primeira vez, em 2003, Aécio lembrou a frase de Tancredo Neves, dita 20 anos antes, quando foi empossado governador: “O primeiro compromisso de Minas é com a liberdade, porque este é um Estado que não se curva, não ajoelha, não rasteja”. Que o diga Tiradentes, o grande mártir da independência do Brasil, mineiro de nascença e o primeiro brasileiro a morrer na forca por liderar uma conspiração contra o domínio português, em 1792.

Aécio faz parte de uma nova geração de políticos brasileiros - tais como os governadores do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e de Pernambuco, Eduardo Campos - mais pragmática, tolerante, universalista e interessada nas boas experiências internacionais, que tem renovado o ambiente nacional com salutáveis e indispensáveis ares de modernidade.

Deputado federal por quatro vezes, ele foi eleito pela segunda vez, em 2006, para o governo de Minas. Do mesmo partido do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Aécio mantém um ótimo relacionamento com o Planalto e comentaristas apontam o neto de Tancredo como um dos possíveis postulantes ao cargo de presidente da República no pleito de 2010 ( ano em que se comemora o centenário de nascimento de Tancredo Neves).

Também a mídia, em várias oportunidades, tem veiculado notinhas apontando Aécio como um dos políticos por quem Lula manifesta um carinho e admiração especiais e a quem ele gostaria que o sucedesse, caso houvesse algum tipo de coligação partidária a nível nacional. Pesquisa realizada pelo instituto Vox Populi, em Belo Horizonte, e divulgada em 13 junho mostrou que 76% dos consultados na capital mineira são favoráveis a uma parceria política entre Aécio e o PT nas próximas eleições municipais.

O MELHOR

Em dezembro de 2007 o jornal “Folha de São Paulo”, através do instituto Datafolha, fez uma pesquisa em nove estados da federação para saber quem era o melhor governador do Brasil. A melhor avaliação coube a Aécio Neves, que recebeu a nota 7,7 dos mineiros, seguido por Cid Gomes, do Ceará, a quem os cearenses deram a nota 6,6, e José Serra, de São Paulo, com 6,5.

Em maio de 2008, uma nova pesquisa nacional (Vox Populi) apontou Aécio como o campeão de popularidade entre os governadores, com 66% dos eleitores mineiros aprovando a sua gestão. Em segundo lugar Roberto Requião, do Paraná, com 54%, e mais Eduardo Campos, de Pernambuco (52%) e José Serra, com 50% de aprovação.

EM ISRAEL

Na visita que fez a Israel, Aécio esteve ao lado do jornalista Roberto D´Ávila que o entrevistou para o programa “Conexão”, da TV Brasil. Debruçado sobre a sacada do mítico Hotel King David, no coração de Jerusalém, Aécio destacou a emoção de conhecer Israel: ”Tenho viajado e estimulado outros membros do governo a fazer o mesmo, mostrando o que Minas pode oferecer a investidores de todo o mundo. Aqui em Israel, estou conhecendo não apenas a história dos israelenses, mas a história da humanidade”.

Acompanhado de investidores brasileiros e assessores, Aécio participou, em Tel Aviv, de um encontro com 40 empresários israelenses dos setores de informática, irrigação e de segurança. Também visitou a Bolsa de Diamantes e o Museu do Holocausto. “O Brasil é uma democracia estável como Israel e o estado de Minas veio convidar empreendedores israelenses para serem parceiros no nosso desenvolvimento para mútuo benefício de nossos povos”, disse Aécio.

A visita do jovem governador mineiro a Israel foi interpretada por articulistas como a mais importante e sugestiva de uma autoridade brasileira nos últimos anos. Isso porque já há algum tempo que lideranças reconhecidamente efetivas e em “alta” no cenário nacional preferem, em suas andanças comerciais, os circuitos europeus ou as rotas dos países produtores de petróleo.

Tornando pública a sua admiração pelo presidente Shimon Peres (prêmio Nobel da Paz em 1994) e pelo estado de Israel, Aécio Neves cativou políticos e empresários em seus encontros com personalidades israelenses, o que levou o correspondente brasileiro Nahum Sirotsky, do Portal IG de notícias (Último Segundo), a escrever um entusiasmado artigo intitulado “Aécio Neves conquista israelenses”.

Uma observação: o atual embaixador do Brasil em Israel, Pedro Motta, que acompanhou o governador nos seus quatro dias de visita, também é mineiro.

MINAS

Do tamanho da França, o estado de Minas Gerais é o terceiro mais rico do país, depois de São Paulo e Rio de Janeiro. Tem 19 milhões de habitantes distribuídos em 853 cidades. Foi lá que se instalou, em 1976, a maior fábrica de automóveis da Fiat fora da Itália. Produzindo 2.500 carros por dia e empregando 20 mil trabalhadores, a Fiat de Minas é responsável por 30% da venda de carros da marca em todo o mundo. O presidente da companhia, Sergio Marchionne, em visita à fábrica em Minas, em 2007, anunciou um mega-investimento de 2,5 bilhões de dólares para a ampliação do complexo.

Aliás, os números da economia mineira impressionam: possui o maior rebanho bovino do país, com 22 milhões de cabeças de gado; é o maior produtor de leite; e responde pela metade da produção total de café. Na área industrial produz 38% do aço nacional e 53% do ferro gusa, produtos exportados principalmente para a China, que em 2007 desbancou os Estados Unidos e se tornou o principal importador na região, comercializando um total de 17 bilhões de dólares. Somente a empresa Vale do Rio Doce, maior produtora de minério de ferro do mundo e que atua em Minas, foi responsável pela extração de 288 milhões de toneladas do produto que é vendido, no mercado internacional, por 47 dólares a tonelada. Além do minério de ferro, os outros produtos mineiros mais exportados para o mercado chinês são o ferro-nióbio, minério de chumbo, ferro fundido bruto, laminados de ferro e aço, celulose, soja e granito.

O estado de Minas também é o maior produtor de ouro, gemas e diamantes do Brasil, daí o interesse do governador Aécio Neves em conhecer a Bolsa de Diamantes de Tel Aviv. Minas responde por 63% da exportação brasileira de ouro em barras, fios e chapas; 43% da exportação de gemas coradas e 72% da produção brasileira de diamantes. Outras pedras preciosas exportadas são a esmeralda, água-marinha e o topázio imperial, hoje em dia somente encontrado na cidade de Ouro Preto. Em 2006, Minas exportou 500 milhões de dólares em gemas e metais preciosos.

Já a Bolsa de Diamantes de Israel movimenta 50% da produção mundial. Em 2006 foram exportados, através da Bolsa, 6,6 bilhões de dólares em diamantes lapidados e 2,7 bilhões em diamantes brutos.

TRÊS CORAÇÕES

Os israelenses também já estão em Minas Gerais desde 2000, quando o Grupo Strauss-Elite comprou, por 41 milhões de dólares, a indústria de café, “Três Corações”, hoje a maior do Estado e uma das 10 maiores do país. Minas é o maior produtor de café do Brasil que, por sua vez é o maior exportador mundial, vendendo, anualmente, 29 milhões de sacas de 60 quilos cada uma ( a saca custa, em média, 140 dólares no mercado internacional).

Hoje o Brasil produz 40% de todo café consumido no mundo e é o segundo mercado consumidor, perdendo apenas para os Estados Unidos, cujo consumo atinge 20 milhões de sacas por ano. Pesquisa aponta que, em média, cada brasileiro consome 5 quilos de café/ano, daí o volume de vendas da indústria do café no país ser estimado em 3,2 bilhões de dólares, o que é um excelente atrativo para os investidores internacionais.

Em tempo: Hoje Minas é o sétimo maior parceiro comercial de Israel entre os estados brasileiros e o seu comércio bilateral, em 2007, atingiu a cifra de 33,1 milhões de dólares.



(21 de junho/2008)
CooJornal no 586


Sheila Sacks é jornalista
trabalha, há 25 anos, na Assessoria de Imprensa da Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro (Emop). Também escreve para o NOSSO JORNAL-RIO, uma publicação voltada para a comunidade judaica.
Rio de Janeiro, RJ
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