16/01/2021
Ano 24- Número 1.206

 

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PEDRO FRANCO

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Amor e seus temperos

Pedro Franco - CooJornal


E já me perguntaram se sou ciumento. Quem perguntou, espantou-se com minha resposta e este espanto se deveu às conotações que se dá ao sentimento ciúme. Dizem algumas pessoas ligadas às interpretações das emoções humanas que ciúme denota falta de confiança de quem o tem e falta de confiança na validade do afeto do ser alvo. Seria então um duplo pecado, pois mostra fraqueza do ciumento e desconfiança do ser amado. Outra faceta que imputam ao ciúme é que ele vê o que não existe, inventa, adultera, torna a vida do ser amado um tormento. A isto chamo ciúme doentio, ciúme raivoso, ciúme paranoico. Portanto vejo vários tipos de ciúmes e quando falo em ciúme estou tirando as aberrações deste natural sentimento. E vão logo os não ciumentos reclamar do adjetivo natural, pois para eles, baseados naquelas concepções acima descritas, o ciúme sempre é doença e perniciosa, que pode e sempre atrapalha o amor. Na minha maneira de encará-lo e por que não dizer, ser, ciúme é um tempero do afeto. E vão ficar zangados ainda mais os não ciumentos comigo: desconfio dos amores sem ciúmes. Vou voltar a esta faceta, só que primeiro vou ficar na comparação do sentimento com o tempero. O tempero não deve tirar o gosto do alimento, deve realçá-lo. Ninguém come tempero puro, ou pelo menos esta não é a regra. Ele modifica o sabor da comida para melhor e muitas vezes vários temperos são usados em pratos mais refinados. O ciúme é dos principais temperos, junto com a doação, a ternura, respeito, a paixão, a compaixão e a sexualidade para a lista não ficar desnecessariamente alentada. Muitos ciumentos dizem que não são ciumentos, outros são poucos ciumentos, valendo ainda dizer que vejo no amor, um amando e outro sendo amado, cambiando esta relação com o tempo de duração da convivência e do amor, ainda que não exista o amorômetro para calibrar os amores. Logicamente que o ciúme se aplaina com o tempo, fica menos áspero e todo o ciumento deve ter seu sentimento sob constante inspeção e sob rédeas curtas. Não pode deixar que o amor tumultue a vida a dois e o objeto do ciúme, melhor dizendo, a musa ou “muso” do ciúme, deve também não provocá-lo, pois as consequências podem ser desagradáveis para os dois. E vou a tal falta de confiança, da qual o ciúme seria um sinal, mau sinal. Total confiança em sua pessoa faria com que o ser amado não pudesse deixar de amar. Não lhe parece até uma empáfia? Já o poeta dizia que o amor fosse eterno, enquanto durasse. O ciúme vive um pouco desta terrível possibilidade de ser efêmero o amor do outro. E que respondi a quem me perguntou se sou ciumento e se espantou com minha honesta resposta? Sou e sou há oitenta e cinco anos, menos dezesseis, quando nos conhecemos. E cá entre nós, você que diz que não é ciumento, já não teve um momento de ciúme e o escondeu sob o manto de cuidado, atenção, ou qualquer disfarce? E uma última pergunta, para dar cores totais à minha interpretação de ciúmes. Sempre que há ciúmes, há amor? Nem sempre, pois pode ser apenas demonstração de posse, de mando, ou mesmo falta de confiança nas potencialidades. Ficou mais confuso? Que faceta do amor não é complexa, sendo ele um sentimento de dificílima ou impossível definição, ou entendimento. Já ouvi de pessoas que na sua relação faltou uma pitada do tempero ciúmes. É assunto que dá para reflexões e não taxativas. Aceitam ciúme como tempero do amor? 


Comentários sobre os textos podem ser enviados ao autor, no email pdaf35@gmail.com 



Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia da UNI-RIO.
Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
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