01/09/2020
Ano 23- Número 1.187

 

ARQUIVO
PEDRO FRANCO

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Vasco e eu

Pedro Franco - CooJornal

Amigo recente, fato raro, ao ler o relato abaixo, comentou. -  Você hoje tão circunspecto e quando jovem... É, de fato nunca tive antes 85 anos.

Era. O era vem por canta do meu amigo vascaíno, João Carlos de Camargo Eboli, tão gentil que nos consolou (meu filho e eu), quando caímos da primeira divisão. Então era dos tricolores que torcem mais contra o Vasco que contra o Flamengo. Talvez a figura de Eurico Miranda possa explicar a birra, ou o que conto. E em dois jornais de 1951/2 saiu que estava indo para o juvenil de basquetebol do Vasco, notícia que só vim saber nesta quarentena. E de fato tenho uma história com o Vasco. Vasco versus Grajaú Tênis Clube, no mesmo ano em que fui da seleção carioca juvenil, certame ocorrido em Santos, julho de 1952. Voltemos ao Vasco X GTC, na quadra de São Januário, ao ar livre, noite de dia da semana. A quadra ficava atrás de um dos gols do campo de futebol. Assistência grande e os jogadores profissionais do futebol, concentrados, assistiam os juvenis jogarem basquete. Eu tinha 17 anos e era o pivô do GTC. Primeiro tempo duro e colocaram um catarina para me marcar (catarinas, recrutas do sul do Brasil, especialmente catarinenses, grandes, fortes e que não primavam pela inteligência. Um comprou um sorvete chica bom e guardou no armário, para comer depois). Estou fora do politicamente correto. O catarina não jogava nada, mas, mandado me marcar, achou que isto dava o direito de me abraçar, o que a regra não permitia. E o juiz nada de marcar. No meio tempo avisei ao técnico que o nosso capitão, enturmado com a Diretoria, ficava trocando bolinhas atrás e Pedro Karabina apanhando no garrafão. Avisei então, assim não dá, o Beto é bom garoto, mas não peita o juiz. Me avisaram que o juiz era peixe de um deputado, que lhe arrumara aquela função, para que ganhasse uns trocados. O Brasil era o mesmo. Voltei de capitão do GTC e assim podia reclamar com o juiz. Antes do segundo tempo. - Seu juiz sou o capitão, o Sr. não entende nada de basquete e, não fora o deputado, não seria juiz. Avise ao catarina, que, se me marcar daquela forma, vai ser falta. Ele fez cara de mau, mas avisou o catarina que não podia marcar daquela maneira. Jogo que segue. E entram dois personagens. O técnico do Vasco se chamava Fu Manchu e vou contar tanta coisa, que vai parecer mentira e não é. E nem é exagero, creia. O Vasco no primeiro time de baquete tinha um jogador chamado Cadete, vascaíno típico, cabelo chapado, cara redonda, uma figura. Acresce que no banco, o treinador, ou alguém da comissão técnica, não podia dar instruções durante o jogo, que só tinha um intervalo, do primeiro para o segundo tempo. Jogadores não eram substituídos para descansar. Jogou mal, aí sim, substituído. E o Cadete sai do banco do Vasco, vai para a arquibancada e começa a dar as instruções do Fu Manchu. Paro o jogo e aviso ao juiz, aquele Senhor é auxiliar do Técnico e está dando instruções. Apontei o Cadete. E o Cadete, típico vascaíno, gritou: -  Garoto fdp você vai ver no fim do jogo. Seu Juiz, o jogador Cadete acabou de xingar minha mãe e o jogo só continua se a polícia o tirar dali. Novos comentários sobre Dona Maria de Lourdes, que em casa de nada sabia. Meus pais só foram a um jogo e isto é outra história. A guarnição de quatro polícias no estádio cuidava da ordem e lá foi tirar o Cadete da arquibancada. Que já fazia coro com o Cadete. Acho, não tenho certeza, que ganhamos o jogo. Acho que sim, até porque dali em diante foi complicado. Findo o jogo, um dos diretores me segredou. A coisa está complicada e querem apanhar você, tão logo saia de dentro do Vasco. Os guardas estão apavorados. Mandei deixar o carro da Diretoria mais adiante e vamos fingir que você vai conosco no ônibus. Tão logo saia do portão do Vasco, dispara para o carro da diretoria, que está longe do ônibus, mais para trás dele e corre o máximo que puder. A porta do carro vai estar encostada e você se joga dentro. Parece que só querem você. Dentro do Vasco, nosso time, os guardinhas apavorados e nos envolta só comemorações sobre minha mãe. Aí eu já estava com medo. Parecia um cortejo fúnebre. Enfim, chegando à porta do Vasco, nunca corri tanto e percebia a patuleia atrás. Joguei-me no carro e o Espanador, era o apelido do motorista, saiu cantando pneus pela Barreira do Vasco. Chegamos ao clube antes de todos. Não apedrejaram o ônibus e a Diretoria, que veio nele, me chamou e levei um bom sabão, pelo que tinha aprontado. Prometo tentar ver qual foi o placar do jogo, pois de fato só me lembro bem do Espanador cantando pneus nas ruas da Colina Histórica. Não aumentei nada. Tudo isto aconteceu, sem tirar, nem pôr. 



Comentários sobre os textos podem ser enviados ao autor, no email pdaf35@gmail.com 



Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia da UNI-RIO.
Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco.



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