15/10/2017
Ano 20 - Número 1.049


 

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PEDRO FRANCO

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Angenor de Oliveira

Pedro Franco - CooJornal

 
“Vai reduzir as ilusões a pó.” – O mundo é um moinho.
“No que se apresenta/ o triste se ausenta.” – Corre e olha o céu.
“E o seu pranto, oh!/ triste senhora/ vai molhar o deserto.” – Disfarça e chora.
“Só não sofre quem não ama.” – Vai amigo.
“Será que amor por ironia/ move esta fantasia vestida de obsessão.” – Senhora tentação.


Muito poeta, acadêmico, ou imortal, devia tirar a cartola para Angenor de Oliveira. Poeta de poucos estudos formais, vida complicada e até expulso de casa pelo pai aos dezessete anos, face à sua boemia, vivia poesia. E sendo alguém e é, tem seu folclore e vou de fatos e lendas, para trazê-los à crônica. Comecei com frases poéticas de Seu Angenor. Será que o pai queria Agenor e o do cartório se fez de engraçado? E fui aos versos e faltou a música. Estes caras da antiga MPB são tão bons, que casam música e letra e aparecem maravilhas. Cartola usava um chapéu, para que os respingos de cimento não lhe sujassem as madeixas. Era ajudante de pedreiro. E de gozação o chapéu virou cartola. E Cartola vive com Dona Deolinda, que lavava roupas para fora. Depois é que veio Dona Zica. Cartola morto, muito Dona Zica apareceu e desmaiou. Como desmaiava Dona Zica! Tiveram bar noturno na Rua da Carioca, Zicartola, com muitos clientes ilustres, só que boêmios não são bons de contabilidades e em dois anos o Zicartola fechou por problemas nas contas. Devia aceitar muito pendura. Ouvi pela primeira vez “Tive sim” na voz de Dona Ivone Lara. “Tive sim um grande amor, antes do seu, tive sim”. E Cartola contava que nos dois lares havia alegria, só que comparar amores, seria o fim, “vou parar, pois não pretendo amor te magoar”. Interpretações livres, ainda que comparar amores seja difícil, porque não há amorômetros. E “As rosas não falam”. Dona Zica plantou rosas, que logo desabrocharam e lhe perguntou por quê? Resposta. As rosas não falam. Frase na cabeça e nasce das mais lindas músicas do cancioneiro brasileiro. “Apenas exalam o perfume que roubam de ti”. Disse também que o mundo é um moinho, verdade, só que para ele foi mais gangorra, que moinho. Meio alto, lá em baixo e vem uma das maiores obras do bom Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, o das certinhas do Lalau). Ipanema, noite e Seu Angenor lavava carros. Sérgio o reconhece, põe a boca no mundo e levanta a vida de Cartola, doente e no “miserê”. Gangorra sobe e não mais cai. Ainda bem. Todos voltam a cantar Cartola, que também canta e encanta. Sete dias antes de morrer, avisou, "no meu enterro quero Waldemiro tocando bumbo". Waldemiro tocou. Muitos anos antes dois amigos no Carnaval sambavam no Bloco dos Arengueiros. Carlos Cachaça e Cartola eram amigos e arengueiros. Nasce do bloco a Estação Primeira de Mangueira de tantas glórias entre as escolas de samba. Angenor, tricolor de coração, não colocou verde e grená, só que ficou perto, verde e rosa são as cores que escolheu para sua escola. Grande escolha, Sambista. Nariz com problemas por doença e Dr. Ivo Pitanguy faz o que pode. Quantos importantes procuram Cartola! Dias antes de morrer recebe Carlos Drummond de Andrade. Poeta reconhece poeta! Cartola nasceu em 11/10/1908 e encantou em 30/11/1980. No seu caixão a bandeira do nosso querido Fluminense Futebol Clube! Ainda agora Teresa Cristina e Carlinhos Sete Cordas, estamos em 2017, trazem CD com músicas de Cartola e com três, que Cartola gostava de cantar, ainda que fossem de autores amigos. Bom de ouvir este CD. Teresa e Carlinhos me têm acompanhado no automóvel nestas manhãs. Era muita notícia de malfeitos logo pela manhã e troquei a ótima CBN pelos CDs. Hoje pela matina fui de CD com Teresa Cristina, amanhã penso ir com a voz do próprio Angenor de Oliveira e seus sucessos, que também há em CD. O homem morre, suas obras persistem, quando merecem. E Cartola merece. Obrigado, Sérgio Porto. 

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pdaf35@gmail.com

(15 de outubro 2017)
CooJornal nº 1.049



Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia da UNI-RIO.
Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
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