Jorge Elias Neto
A SOBREVIVÊNCIA DO EFÊMERO E A FALÊNCIA DO INSTANTE
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O contorno só interessa aos apressados
Afinal, é
chegado o tempo em que o silêncio e a contemplação passaram a fazer parte do
comportamento de um transgressor. É o que conclama a balbúrdia
multimidiática de nossos dias.
Na verdade, nada mais efêmero que o
conceito numérico dos dias, um ou dois dígitos não preenchem o vazio do
homem pós-moderno.
E os “vencedores” propõem: Falemos do caos
binário, já que se tornou “feio” falar do Sol e da Lua.
O choque. O
homem e o tempo, com seus instantes vendidos em módulos. Uma overdose de
estímulos de duração efêmera. Eis a droga que carece ser discutida, esta que
alimenta o corpo fluido e seus receptores cerebrais carentes de imagens.
Mas deveríamos contestar a sutileza do instante e a beleza do efêmero?
Faz-se necessário então conceitualizar o que costumamos chamar de instante e
de efêmero.
O adjetivo efêmero é derivado do grego ephêmeros, -os,
-on, que dura um dia. Em sua origem, a palavra efêmero nos diz da poesia das
águas perenes dos riachos que só existem durante o degelo ou a estação das
chuvas; da flor da noite que desabrocha e fenece ao longo da madrugada.
Efêmero é a imensa amplidão da transitoriedade fugidia.
Daí, se
dizemos: Está suspensa a transitoriedade das insignificâncias, não é uma
imposição, é muito mais, é uma exposição. Nos expomos ao deixar transparecer
o desespero por resgatar o sentimento do homem pelo efêmero; dizer do que
repica no peito, da percepção da urgência de que o homem reaprenda a
aquaplanar o momento, ocupando com silêncio e reflexão o espaço que sucede à
transitoriedade do instante.
É isso - buscar no instante o paradoxo
da pausa.
Mas é outra a definição de instante que nos coloca à
deriva. E os dicionários são precisos, diria premonitórios, quando nos
apresentam o adjetivo instante (derivado do latim instans, - antis, - are)
como aquele que insta, que insiste com obstinação, que vai logo, iminente,
URGENTE – que diz uma necessidade premente. O sufixo – are diz da soberba
humana, da vontade de poder, estar de pé, erguer-se (o deus bípede, que se
aproxima – ameaçador). Quando utilizado como substantivo masculino, a
palavra instante traduz-se no “menor espaço apreciável de tempo, momento,
ocasião”.
E eis o homem colocado à deriva no mar da pós-modernidade,
sujeito às intempéries dos instantes impostos e desejados. E esse ser
fluido, partícula em suspensão nesse mar batido de uma sociedade de consumo,
torna turvas as águas do Planeta.
Onde encontrar tempo para o espasmo
diante de uma imagem fulgurante, não a imagem digitalizada, pixelada no
écran da mídia de bolso, mas a imagem efêmera, construída pacientemente,
pela evolução do deus Darwin?
Quando jovens, aprendemos com nossos
ídolos a valorizar o momento, o agora. Vivificar o instante se mostrou a
melhor forma de ter uma vida saudável e feliz. E o homem “sábio” incorporou,
em graus variáveis, essa máxima.
Acontece que o mercado e as grandes
corporações sempre estiveram atentas a esse fato e se desdobraram, e
continuam se desdobrando, para ampliar e diversificar as “ofertas de
instantes”.
Mas o que acontece quando o instante se fluidifica
demasiadamente, se torna cada vez mais instantâneo, insatisfatório? Quando o
instante passa veloz; quando um piscar de olhos nos impõe uma limitação
fisiológica para vivenciá-lo? Ocorre a desertificação da vida, pois uma
frustação insustentável passa a dominar o indivíduo.
E é com essa
noção insalubre do instante e esperançosa do efêmero que devemos observar o
homem que se adentra no século XXI.
(RT, 1º de maio,
2017) CooJornal nº 1.027
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