Saio do médico e o táxi já está na porta me esperando. Pensativa e não disposta a muita conversa, quase monossilábica agradeço ao motorista que, solícito, abre a porta. “La ra la ra la ra la ra, passar a tarde em Itapuã, com um velho calção de banho, um dia pra namorar...” ele canta com um lindo timbre, pouco se importando com a letra. Como interferir, se ele batucava no volante com tanta alegria!? Eu queria silêncio, paz, mas reconsiderei, afinal, trabalhar nesse trânsito doido de final de tarde requer mais do que entusiasmo e paciência e, se ele bem se sentia, que fosse em frente. “Um sol que não tem tamanho, meu arco-íris no ar. La ra la ra la ra la ra, é bom!”

Eu buscando olhar longe, mas me divertindo com o desencontro, lá vem conversa:

– A senhora gosta do Toquinho? E o Chico tá maravilhoso! Sou apaixonado por eles. Nada de funk. Na minha casa não. Minha mãe ouvia só música boa e passei isso pros meus filhos. Também sou compositor.

Pensei que, interrompendo, ia encerrar ali:

– Não é o Chico. É o Vinicius.

– Ah, a senhora entende de música. Tem razão, acho mesmo que é o Vinicius. E essa cantora, me ajuda, não é a Miúcha.

Sem querer lhe dar atenção, concluo qualquer coisa, mesmo a mente repetindo tá errado:

– É a Maria Creuza.

Ele não olhou só pelo retrovisor, virou o corpo todo para trás e ficou me encarando. Em seguida voltou a batucar e a cantar.

Já na esquina de casa, a sequência musical termina e o locutor enumera as melodias... e “Uma tarde em Itapuã”, com Vinicius, Toquinho e Marilia Medalha.

Uma gargalhada espontânea explodiu:

– 1 a 1! Eu sabia, eu sabia que era a cantora que tinha ganhado uma medalha, só não quis embaraçar a senhora.

Sorridente, ar vitorioso, abre a porta. Salto e ele acena, não sem antes aumentar o volume do rádio e voltar a cantar. “Mas se Elza voltar, se Elza voltar, que coisa linda...”

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