27/05/2006
Número - 478

ARQUIVO
IRENE SERRA


Irene Serra  
  

Que estranha cadeira!

 

Hábitos e costumes não se discutem, mas que nos causam estranheza, muitas vezes, é verdade. E que tantas outras nos encabulam, sem sabermos como sair da situação, também é vero.

Não sei se ocorre em toda cidade do interior de São Paulo mas, aqui onde estou, é comum ouvir a buzina do sorveteiro; o sino do vendedor de melancia, tangerina e laranja; a matraca da senhora do queijo e por aí vai. Fora a Pour Elise tocada diária e ininterruptamente pelo caminhão entregador do botijão de gás. (Beethoven nunca imaginaria que isso fosse acontecer com sua doce música!) O interessante é que todos os sorveteiros têm a mesma buzina, todos os fruteiros têm o mesmo sino... então, é fácil saber quem está passando na rua e se apressar se quiser comprar algum destes itens. Sendo que, se necessário fazer alguma encomenda, pode fazer, porque todos cumprem o que prometem trazer.

Precisando de uma passadeira, pois a roupa se acumulava e eu não estava com a mão boa para arrumá-la (ah, essa artrite!), perguntei à “queijeira”, que tem clientela em toda a rua, se ela conhecia uma passadeira - e aí seguem-se as recomendações de sempre: honesta, trabalhadeira, limpa, etc. De imediato ela se propôs a me ajudar e, dois dias depois, vinha pessoalmente com a dita.

- Boa taRde. Terei muito prazeR em ajudaR a senhora.

Achei que sua língua ia dar um nó nos erres, mas nem tive muito tempo para apreciar sua locução caipira, porque, assim que comecei a falar, ela começou a rir com a mão em frente aos lábios: - A senhora num é daqui não! Fala engraçado!

Engoli meu próprio sorriso e resolvi ir logo ao ponto de meu interesse, perguntando-lhe quanto cobrava a diária.

- Uma cadeira é R$15,00.

Olhei com espanto, afinal, não queria serviço de marcenaria ou carpintaria. Que mal entendido houvera quanto disse à “queijeira” que queria uma passadeira? Uma passadeira de roupa!

- Não estou entendendo! Como uma cadeira?

- É. Eu cobro a cadeira. Vou colocando a roupa passada em cima de uma cadeira. Quando a cadeira está cheia, acabou meu trabalho! E vorto a trabalhaR, outro dia que a senhora me chamaR.

Continuo sem passadeira.  Vocês conhecem alguma para me indicar?




(27 de maio/2006)
CooJornal no 478


Irene Vieira Machado Serra
professora, foniatra, editora da Revista Rio Total
RJ 

irene@riototal.com.br