16/01/2021
Ano 24 - Número 1.206
 


ENÉAS ATHANÁZIO
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Enéas Athanázio


A ENGENHOCA DO DR. DUVIGE

Enéas Athanázio - Colunista, CooJornal

 

Francisco de Vasconcellos é um pesquisador de primeira linha nas áreas da história e do folclore no atual cenário cultural brasileiro. Sua obra é imensa, abordando sempre temas curiosos e instigantes, muitos deles desconhecidos ou pouco versados. Sua contribuição é das mais importantes e constantes porque está sempre produzindo e publicando novas obras. Tem uma impressionante visão panorâmica dos temas a que se dedica, dando a impressão de ter na cabeça o mapa histórico e folclórico nacional com nomes, datas, detalhes e tudo mais. Move-se nesse cipoal intrincado com a segurança de quem sabe aonde vai.


Em seu livro mais recente, Francisco de Vasconcellos retira do ostracismo uma figura das mais curiosas do meio jurídico e político do país. Trata-se do Dr. Manoel Edwiges de Queiroz Vieira, advogado militante no Rio de Janeiro e proprietário de uma fazenda na Serra de Petrópolis com o estranho nome de Engenhoca, onde ele se refugiou em período de crise. O ensaísta rebusca tudo a respeito do personagem, desde suas origens, descendência, familiares e tudo mais, com as respectivas datas e pormenores de interesse. Também se debruça sobre a história da própria fazenda, cujo nome, a meu ver não encontra explicação. Na boca do povo o proprietário se transformou no Dr. Duvige.

Mesmo residindo em Petrópolis, ele descia para o Rio duas vezes por semana para cuidar de sua banca. Metódico e dedicado. Envolveu-se na política e foi Vereador em Petrópolis mais de uma vez. No plano nacional, apoiou o Marechal Hermes e foi por ele nomeado Chefe de Polícia do Distrito Federal e depois Ministro da Agricultura. Como Chefe de Polícia foi implacável no combate à vadiagem, à prostituição, às drogas, à jogatina e à corrupção, conquistando incontáveis inimigos que mais tarde moveriam contra ele tremenda campanha através da imprensa. Não perdoava a menor irregularidade com o dinheiro público, sendo apontado como repressor mas de inflexível conduta ética. Deixando esse cargo, foi guindado ao Ministério da Agricultura, quando suportou uma campanha odiosa que tentava por todos os meios intrigá-lo com o Presidente. Nem um e nem o outro se curvaram e ele permaneceu no cargo até o final do mandato presidencial.

Quanto à Engenhoca, tratava-se de uma propriedade quase improdutiva, mantida mais como refúgio do proprietário e sua esposa, D. Sinhazinha. Coberta por densas matas que ele defendia com paixão, produzia apenas o indispensável ao consumo doméstico, inclusive pimenta que ele usava nas refeições e até carregava no bolso do colete. Existia na fazenda um monjolo para pilar milho, mas, ao que parece, sem conexão com o nome da propriedade. Houve pelo menos três tentativas de transformar a Engenhoca em prado para corridas de cavalos, mas as iniciativas não vingaram. Parece que a Engenhoca se mantinha recatada, longe do grande público. É interessante notar que Eduwiges era antipatizado na região, fosse pela sua ação na Chefia da Polícia, fosse pela defesa intransigente da Engenhoca, mas o fato é que se elegia Vereador e tinha influência na política estadual. Homem de forte personalidade, não transigia com os seus princípios.

O novo livro de Francisco de Vasconcellos pode ser lido como um romance que se envolve com a política de antanho que, a rigor, é a mesma de hoje. Vale a pena ser lido para conhecer um pouco mais de Brasil.
 

Comentários sobre o texto podem ser enviados ao autor, no email e.atha@terra.com.br  



Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC





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