22/02/2013
Ano 16 - Número 828

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

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Enéas Athanázio



TRAJETÓRIA VITORIOSA

Enéas Athanázio - Colunista, CooJornal

Os escritores memorialistas, em geral, sofrem restrições dos críticos, mas agradam os leitores. Enquanto aqueles enfatizam a suposta pobreza ou falta de imaginação no aproveitamento de fatos vividos na obra de ficção, estes últimos encontram sempre meios e modos de se encaixarem na pele de algum personagem, rememorando cenas de suas próprias vidas que lhes parecem assemelhadas ao texto ficcional.

Escritores hoje consagrados, a exemplo de Lima Barreto e Godofredo Rangel, foram vítimas dessa oposição crítica, circunstância que contribuiu para dificultar a divulgação e a serena análise de seus trabalhos. Na verdade, porém, essa colocação dos analistas, como toda posição irredutível, não tem sentido.

Não importa de que ingredientes se valeu o autor para chegar ao resultado, ou, por outras palavras, onde foi buscar “inspiração”, desde que o resultado obtido atinja as dimensões artísticas almejadas. E, se a memória humana constitui o elo de ligação entre o passado e o presente de cada homem, não se atina porque não devam, ou não possam, as ocorrências vividas se transformarem em contos e romances. Não se pode conceber que as lembranças de cada um, que se constituem da experiência acumulada, tenham que ser postas de lado para a criação literária em favor de cenas, fatos e pessoas inteiramente imaginários e que muitas vezes, por isso mesmo, perdem a verossimilhança.

Parece inegável que esse tipo de literatura exige talento, eis que transformar pequeninos acontecimentos do cotidiano em histórias vivas e interessantes não é tarefa fácil, aumentando a dificuldade na medida em que mais simples e rotineiros são esses fatos. Realmente, só a grande habilidade na estruturação do conto ou do romance e no manejo da frase pode dar a narrações singelas a necessária densidade psicológica que as eleve às dimensões de arte capaz de prender o leitor.
Nesse particular, o escritor Nege Além é um vitorioso. Com efeito, o seu livro de contos “Rua Taboão” constitui-se de um conjunto de histórias baseadas em fatos simples que o seu talento soube transformar em contos atraentes, movimentados, cheios de observações e ensinamentos para a vida e que, sem dúvida, agradam aos seus leitores, qualquer que seja a idade ou a condição.

Fatos mais ou menos comuns a toda uma geração ganharam no volume o contorno de excelentes contos. Assim, a luta desesperada para não perder o capítulo do “seriado” no cinema da cidadezinha, as privações e os sacrifícios para economizar os cinco mil-réis, o sonho irrealizado de obter uma bola de “capotão”, o doloroso contato com a miséria da família, eis alguns dos temas aproveitados. A guerra de rua, ferrenhamente travada entre os grupos antagônicos, com seus planos e retiradas (sem faltar a figura do “traidor”), é um dos excelentes momentos do livro. Um livro que, no conjunto, constituiu-se num dos bons lançamentos do ano de 1977 e que agora volta às livrarias em segunda edição, muito bem publicada e ilustrada por Paulo C. Florençano (Scortecci Editora – S. Paulo – 2012).

Nascido no Rio de Janeiro e radicado no Estado de São Paulo, Nege Além é autor de treze livros, entre contos e romances, participou em inúmeras antologias e recebeu prêmios importantes. É membro de entidades culturais, entre elas a UBE/SP (União Brasileira de Escritores).
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Contatos com o autor comentado; negealem@uol.com.br 



(22 de fevereiro/2013)
CooJornal nº 828



Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC


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