19/10/2012
Ano 16 - Número 809

ENÉAS ATHANÁZIO
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Enéas Athanázio



PARA NÃO ESQUECER KIPLING

Enéas Athanázio - Colunista, CooJornal

Com esse título, o Prof. Pedro Albeirice da Rocha escreveu interessante ensaio, publicado numa coletânea (*), e que merece um comentário porque aborda a vida e a obra de um autor que foi muito popular no Brasil e teve em Monteiro Lobato grande divulgador. Seu poema “Se” (“If”), um monumento ao homem de caráter e temperamento inabalável, era visto com frequência em paredes de escritórios e locais de trabalho, assim como seu romance “Kim” foi lido por muitas gerações e Mowgli, o menino-lobo era, e creio que continua sendo, familiar às nossas crianças. Apesar da indiscutível qualidade de sua obra e de seu gênio, foi malvisto pelos intelectuais em geral graças à defesa intransigente que fazia do Império Britânico em poemas e escritos, encarnando, aos olhos de muita gente, o tão odiado imperialismo. Dizem alguns que ele tinha uma visão romântica do imperialismo britânico e um equivocado sentimento patriótico que o levaram a defender o indefensável, ou seja, a perpétua manutenção do domínio britânico sobre suas colônias, em especial a Índia e a África do Sul. Não teria tido percepção para sentir que o império desmoronava.

Joseph Rudyard Kipling (1865/1936) nasceu em Bombaim, na Índia, a mais importante possessão inglesa, e que abrangia também o Paquistão e Bangladesh, hoje países soberanos. “O escritor passou a infância servido por criados nativos, - escreveu o ensaísta – com quem aprendeu o hindustânico. Teve, de início, uma aia portuguesa, o que explica certa intimidade que tem com nomes próprios de origem lusitana surgidos em alguns pontos de sua obra. Mas foi com os indianos que aprendeu muito da Índia, conhecendo histórias fantásticas e relatos que iriam influenciar sua trajetória de escritor. Aos seis anos, o menino falava bem o hindustânico (melhor até do que o inglês). Esse foi, dentre outros motivos, o que determinou a decisão de mandar o menino para a Europa” (p. 184). Nascido na Índia, mas inglês de formação, é natural que Kipling se tornasse um homem dividido, batalhando sempre pela integridade do império. A separação dos países, com certeza, o deixaria perdido ou um estrangeiro em sua própria pátria. Recebeu esmerada educação na Inglaterra e retornou à Índia para exercer o jornalismo. Nessa altura já estava impregnado dos ideais conservadores e imperialistas. Começa a publicar seus trabalhos, retratando quadros indianos, que muito agradam à chamada Índia Inglesa. Viaja muito pelo mundo e retorna, afinal, em definitivo para a Inglaterra. Residiu por alguns anos nos Estados Unidos.

Em 1907, aos 42 anos de idade, recebe o Prêmio Nobel de Literatura. Acentua-se sua luta em favor do “Império onde o sol nunca se põe” e continua a produzir com imenso sucesso. É um escritor vitorioso e rico, mas amargurado pela perda de dois filhos e pela desagregação do Império Britânico que tanto defendia. Seu posicionamento político causa indignação, é rejeitado pelos colegas de profissão. Hemingway dizia existir um “bom” e um “mau” Kipling.

A despeito de seu declarado imperialismo colonialista, a obra de Kipling sobrevive e se espalha pelo mundo. A magia de suas histórias indianas e a beleza de sue versos cativam os leitores. “A sobrevivência do nome de Kipling no Brasil se deve, em especial, a Monteiro Lobato, que o admirava apaixonadamente e traduziu “The Jungle Books” e “Kim” - afirma o ensaísta (p. 195). E, de fato, muitas são as declarações de Lobato em favor da obra de Kipling em seus escritos, ainda que seus posicionamentos políticos fossem opostos. Por tudo isso, como enfatiza o autor do ensaio, a obra de Kipling é a realização de um gênio e não merece o esquecimento. O ensaísta é ligado ao nosso Estado, tendo aqui lecionado, e residiu em Florianópolis e Chapecó.
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(*) “Tecido de leituras sobre linguagem, identidade e cultura”, Pedro Eduardo de Lima e Rejane de Souza Ferreira (Org.), Goiânia, Pontifícia Universidade Católica de Goiás, 2011. p. 183.



(19 de outubro/2012)
CooJornal nº 809



Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC


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