18/05/2012
Ano 15 - Número 787

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

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Enéas Athanázio


GARCÍA MÁRQUEZ

Enéas Athanázio - Colunista, CooJornal

A Editora Zahar, do Rio de Janeiro, vem publicando uma série de pequenos volumes em que são abordadas a vida e a obra de escritores, filósofos e cientistas para serem lidos em 90 minutos. Embora de tamanho reduzido, em formato pequeno e com cerca de 100 páginas, os livros não são superficiais e fornecem uma visão bastante completa do autor abordado. Entre os volumes publicados até agora foram estudados Beckett, Borges, D. H. Lawrence, Dostoiéwski, Hemingway, Joyce, Kafka, Nabokov, Poe, Tolstoi, Virgínia Woolf e Gabriel García Márquez, a respeito do qual farei alguns comentários. O autor da série é Paul Strathern, professor e escritor radicado em Londres, onde também exerce o jornalismo cultural.

García Márquez, escritor colombiano, detentor do Prêmio Nobel (1982), é das maiores figuras das letras universais e um expoente da literatura latino-americana, por demais conhecido dos leitores brasileiros. Entre seus grandes precursores, aqueles que abriram os caminhos do mundo para os autores da região, destacam-se Rubén Darío, da Nicarágua, Jorge Luis Borges, da Argentina, e Pablo Neruda, do Chile, os reveladores de uma arte literária de primeira linha que “nunca foi primitiva, porém desde seus primórdios foi coberta por um lirismo ligeiro, quase infantil, que sempre conservaria “ (p. 17). Sob tão auspiciosos influxos, não seria de admirar que surgisse um García Márquez, influenciado também por William Faulkner, o grande retratista da sociedade sulista americana. Com a diferença de que García Márquez desviou-se de todos eles, construiu algo próprio e pessoal e, em certo sentido, ultrapassou-os. Todos esses aspectos são abordados pelo ensaísta aqui comentado.

Após longo e paciente aprendizado, escrevendo, pensando, observando, García Márquez já havia firmado sérias conclusões a respeito do que desejava produzir. Ouvindo as histórias de sua região natal, tomou consciência de que elas continham uma realidade própria que faltava às suas próprias histórias e também às de seus grandes predecessores. “Essa realidade própria era uma transformação poética da realidade que tentavam descrever e esse deveria ser o objetivo de sua literatura, não apenas as lições que aprendeu com seus grandes predecessores” (p. 50). E com essa visão muito clara na cabeça, tratou de escrever e escrever, trabalhando por horas a fio, sem cansaço, começando mil vezes, forrando o chão ao seu redor com as folhas amassadas, até chegar o mais próximo possível do imaginado, como relata em suas memórias. Assim, passo a passo, García Márquez foi construindo aquele realismo mágico que lhe era algo exclusivo, ainda que ele já existisse há muito na literatura latino-americana de forma algo difusa. E logo sua versão desse realismo mágico estava correndo mundo e influenciando a literatura em todos os quadrantes. Esse fenômeno tão incomum aconteceu com a publicação do romance “Cem anos de solidão”, em 1967, cujo impacto foi de tal ordem que as vendas se multiplicaram e as traduções para os mais diversos idiomas se repetiram com grande rapidez. “Foi essa identificação que tanto entusiasmou seus primeiros leitores – diz o ensaísta. – Aqui (no romance) estava refletida sua realidade pessoal, política, doméstica e até existencial da América Latina. Nunca antes fora feita essa justiça ao mundo no qual viviam, com tudo – de suas trivialidades às suas tragédias” (p. 78). Apesar de tudo que possa parecer estranho ou incomum no romance, nada do que está ali, nem uma palavra sequer, nasceu sem base na realidade, como sustenta o próprio romancista.

Outras obras importantes foram por ele produzidas, todas de exemplar qualidade literária, sempre acolhidas com entusiasmo. “O amor nos tempos do cólera” obteve invulgar sucesso entre nós. “A incrível e triste história de Cândida Erendira e sua avó desalmada” fez enorme sucesso e propiciou um filme admirável. “Crônica de uma morte anunciada”, “Ninguém escreve ao coronel”, “Os funerais da Mamãe Grande”, “O outono do patriarca”, “O general em seu labirinto” e muitas outras compõem uma das mais ricas bibliografias da literatura moderna, sem esquecer as coletâneas de contos, crônicas, relatos, reportagens, críticas e as extraordinárias páginas das memórias: “Viver para contar.”
                 

(18 de maio/2012)
CooJornal nº 787



Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC


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