12/02/2011
Ano 14 - Número 722


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




QUEM CONHECE CALMON? (2)


 

Enéas Athanázio, colunista - CooJornal

Retomando a história de Calmon, vale lembrar que no caos instalado na região entendeu o Paraná que seu território estava sendo violado e para lá foi enviada uma tropa sob o comando do coronel João Gualberto. No chamado Combate do Irani se confrontaram as tropas legais e os revoltosos, estes sob o comando do “monge” José Maria, em 22 de outubro de 1912. Nessa contenda perecem os dois chefes – morrem João Gualberto e José Maria. A morte deste espalhou um rastro de ódio nos corações dos caboclos, a guerra se estendeu por toda a região e os insurgentes chegaram a dominar imenso território. Conhecedores do terreno e donos de uma coragem sobre-humana, praticavam a guerra móvel, precursora das guerrilhas, deixando desnorteadas as forças legais, atacando e recuando. Chegaram a invadir a vila de Curitibanos e ameaçaram Porto União, criaram os célebres redutos e usaram a surpresa como estratégia.

Em 5 e 6 de setembro de 1914 chegou a vez de Matos Costa e Calmon. A primeira, antiga São João dos Pobres, foi atacada e incendiada com rara violência, sob o comando de Venuto Baiano. A fúria dos ataques não encontrou limites. Todos os homens adultos foram mortos e o fogo lavrou, nada restando da vila e das instalações ferroviárias. Em Calmon, a serraria da Lumber, símbolo do poder estrangeiro, foi reduzida a cinzas. Barracões, instalações, pilhas de madeiras serradas, toras e dormentes em estoques arderam por dias e noites e as labaredas infernais iluminaram o sertão em derredor. Só a Serra da Pirambeira, nas proximidades, contemplou em silêncio a gigantesca fogueira. O ataque foi chefiado por Chiquinho Alonso, figura controvertida, que teria na época apenas 16 anos. Violento para uns, calmo para outros, pouco se sabe a seu respeito, embora votasse ódio aos americanos. A estação ferroviária também foi consumida pelo fogo e no local seria erguida a atual. O capitão Matos Costa foi morto no dia 6, num equívoco lamentável, porque era um pacifista e entendia os reclamos dos caboclos.
Nos meus dias de garoto, andando por ali, ainda vi destroços de máquinas e ferragens calcinados pelo fogo. Também conheci o chamado Poço dos Jagunços, onde diziam ter encontrado esqueletos sem cabeças, vítimas das terríveis degolas a facão.

Calmon deve seu nome ao engenheiro baiano Miguel Calmon du Pin e Almeida (1879/1935), sobrinho do Marquês de Abrantes, figura de expressão do Império e que tinha o mesmo nome. Colega do escritor Lima Barreto na Escola Politécnica do Rio, Calmon foi Ministro da Viação com apenas 27 anos de idade e realizou inúmeras obras de vulto, entre elas a Linha Sul da extinta Rede Viação Paraná-Santa Catarina que passava pela cidade que leva seu nome. A ferrovia, porém, só foi inaugurada em 1910, tendo Calmon deixado o Ministério no ano anterior. Não se sabe ao certo se ele visitou o local. Afirmam alguns que acompanhou o Presidente Afonso Pena, também patrono de uma estação, àquela região; outros sustentam que não. Em livro de Regina Abreu, publicado em 1996, essa ferrovia nem sequer é relacionada entre as obras realizadas nas duas gestões de Calmon como Ministro. Pedro Calmon, antigo reitor da Universidade do Brasil, sobrinho e biógrafo de Calmon não e refere ao assunto.

Despojada de sua riqueza natural e sem receber nada em troca, a região de Calmon ficou empobrecida e jamais se recuperou por completo. As marcas da guerra, a ausência de estradas, o total abandono e o clima severo dificultaram seu desenvolvimento. Com poucos recursos, a Administração, tendo à frente o Prefeito Alcides Boff, conterrâneo de Campos Novos, luta como pode, apoiada por um povo decidido. Melhoramentos urbanos têm sido realizados e a cidade aos poucos ganha um renovado aspecto urbano. As imensas plantações de “pinus eliotti” movimentam indústrias e a agricultura progride. A antiga estação ferroviária foi restaurada e nela instalado um museu.

Calmon e a região do Contestado guardam uma história repleta de fatos que instigam os pesquisadores e deram margem a uma imensa bibliografia na qual a pequena cidade está inserida e que não cessa de crescer. É pena que todo esse acervo ainda seja ignorado por muitos catarinenses.



(12 de fevereiro/2011)
CooJornal no 722


Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

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