31/07/2010
Ano 13 - Número 695


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




OS DESENCANTOS DE JOVITA



 

Enéas Athanázio, colunista - CooJornal

Desde menina Jovita cultivava um ardente patriotismo. Irritava-se e protestava com aspereza ante qualquer crítica ao Brasil e jamais escondia seu amor pelo país. No curso da Guerra do Paraguai acompanhava com interesse as manobras militares, vibrando com as vitórias e sofrendo com as derrotas, recusando-se, contudo, a admitir que nossas tropas fossem derrotadas no final das hostilidades. Não existia outra alternativa senão a vitória.

Nem tinha ainda dezoito anos quando tomou uma decisão insólita e definitiva. Trajando calças masculinas e com os cabelos cortados rentes, deixou os confins de Jaicós, onde residia, para alistar-se como voluntária e combater pelo Brasil. Descoberto seu disfarce, tentaram impedir o ingresso nas forças combatentes, mas, graças aos seus fervorosos apelos, foi comissionada no posto de sargento pelo então presidente da Província e passou a integrar o 2º. Corpo de Voluntários da Pátria, no qual logo se destacou.

A espantosa atitude da jovem teve intensa repercussão em todo o país e Jovita se viu sagrada heroína nacional. Recebeu as mais calorosas homenagens públicas em São Luís, João Pessoa, Recife, Salvador e no Rio de Janeiro, onde foram ainda mais efusivas. Toda a imprensa destacou seu gesto de heroísmo e dedicação à pátria. Não obstante, as autoridades militares, amparadas na legislação da época, impediram sua incorporação como combatente. Admitiram, no entanto, que acompanhasse as tropas “como qualquer outra mulher das que se admitem a prestar, junto aos corpos em campanha, os serviços compatíveis com a natureza do seu sexo.” Indignada, rejeitou a oferta, pois não era uma mulher qualquer. Sofreu por muito tempo, frustrada no seu ardente desejo de servir à pátria num momento tão delicado de sua história em que estava em jogo a honra da própria nação. Mas nada podia fazer e amargou o primeiro grande desencanto de sua vida.

Permanecendo no Rio de Janeiro, foi tomada da grande paixão de sua breve existência. Conheceu na antiga capital um engenheiro inglês de nome Guilherme Noot por quem se apaixonou, acreditando que seu amor fosse correspondido com sinceridade. Passaram a viver juntos e assim permaneceram por algum tempo. Até que um dia o inglês teve necessidade de retornar ao país de origem e nunca mais retornou. Abandonada e ferida no seu amor próprio, Jovita padeceu o segundo desencanto. Não conseguiu superar o trauma sofrido e acabou se suicidando, fato que provocou grande consternação de todos que a conheciam. O doloroso desenlace parecia seguir na trilha de vida dos grandes heróis, culminando em tragédia. Hoje pouco lembrada, Jovita foi um exemplo de coragem e incomum devoção ao Brasil.

Nascida em 1848, faleceu em 1867, aos 19 anos de idade, em plena juventude. Segundo depoimentos, foi uma moça morena, esbelta e bonita, de aspecto esportivo e saudável. Seu nome completo era Jovita Alves Feitosa e os bons dicionários biográficos lhe dedicam um verbete. Inspirada em sua vida, esta crônica é uma homenagem a quem tanto deu de seu amor ao país e ao homem que escolheu. E foi por ambos rejeitada.


(31 de julho/2010)
CooJornal no 695


Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

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