15/05/2010
Ano 13 - Número 684


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




UM LIVRO DE ARREPIAR



 

Enéas Athanázio, colunista - CooJornal

Para quem se dá à leitura dos jornais, nada ou quase nada do que se encontra neste livro é grande novidade. Mas o que choca é a forma sistemática e metódica como os fatos são descritos, com todas suas implicações e consequências. Refiro-me ao livro “Honoráveis Bandidos”, de Palmério Dória (Geração Editorial – S. Paulo – 2009), em que esse experiente jornalista faz um levantamento, por assim dizer dia a dia, dos negócios em que está envolvido o clã Sarney desde o início da carreira política de seu chefe, o senador José Sarney, há mais de meio século. Observando, pesquisando e anotando, o autor registrou tudo que descobriu, desenhando um panorama de arrepiar. É verdade que nem sempre as provas são concludentes e tudo fica no terreno das suposições, embora fundadas e lógicas, compondo um conjunto impressionante e que deixa o leitor deveras indignado e se perguntando como isso pode acontecer num país que pretende se impor, em breve, como potência mundial. É a demonstração de que crescemos em alguns aspectos e em outros tantos continuamos engatinhando.

Para explicar a incrível teia de interesses espalhada no país pelo clã, o autor encontrou as peças daquilo que chama um tripé. Assim, o primeiro pé do tripé está no domínio, através de prepostos, do sistema energético nacional; o segundo pé estaria na terra, que começou a ser fincado no Maranhão, e com o qual, segundo o autor, foi feita uma reforma agrária às avessas, criando latifúndios que expulsaram inúmeros pequenos proprietários e os obrigaram a migrar para outras regiões; o terceiro e último pé estaria nas comunicações, obtendo concessões de emissoras de rádio e televisão que permitiram exercer imensa influência na opinião pública maranhense. Assim apetrechado, o clã não apenas se perpetuou no poder como amealhou uma fortuna incalculável e que, afirma o autor, não pode ser explicada. Dominando jornais, emissoras de rádio e televisão, a oligarquia se instalou com segurança no poder local e dali estendeu seus tentáculos pelo país. Nesse triste episódio o povo foi vítima de uma espécie de lavagem cerebral através do discurso único, como também aconteceu em outros Estados, inclusive aqui, onde velhas oligarquias dominaram por tanto tempo.

Minucioso, o livro vai desfiando o interminável rosário de casos em que Sarney, os filhos e o grupo estão envolvidos, muitos deles sob investigação da polícia federal, o que estaria colocando os integrantes do clã em permanente sobressalto. Mas o tempo passa, nada acontece e eles continuam encastelados no poder. O próprio livro, fruto de imenso esforço de Palmério Dória, obra de arrojo e coragem, parece ter caído no vazio. Tudo indica que nada mudará.

Enquanto isso, na vizinha Argentina, a Justiça continua condenando seus ex-ditadores. Num julgamento histórico, o último deles e mais seis de seus asseclas foram sentenciados a penas que vão a 25 anos de reclusão em regime fechado. É bem provável que partirão desta para melhor sem respirar o doce ar da liberdade que negaram com tanto empenho e por tantos anos àquele bravo povo. A decisão da Justiça argentina é um magnífico exemplo para os golpistas de todos os matizes.

E aqui entre nós, se já não bastasse a infame farra-do-boi, que ainda perdura apesar do repúdio da opinião pública e da repressão policial, veio à tona a desumana disputa a que chamam puxada de cavalos, em Pomerode, na qual os pobres animais são forçados a arrastar toneladas de peso. Diante dos protestos, os organizadores reagiram com incrível violência. E o pior é que ninguém tomou qualquer providência, as autoridades cruzaram os braços, e parece que aquilo continuará a ser praticado com inteira liberdade. É uma tristeza!



(15 de maio/2010)
CooJornal no 684


Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

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