12/12/2009
Ano 13 - Número 662


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




 

SETÚBAL EM SANTA CATARINA


 


Entre os livros de destaque no período figura “Vida, obra e época de Paulo Setúbal”, de Fernando Jorge (Geração Editorial – S. Paulo – 2003), que vem despertando grande interesse de leitores e críticos. Mais que uma biografia, ele apresenta um amplo painel da vida cultural e literária brasileira nas quatro primeiras décadas do Século XX, sempre com as minúcias e os fundamentos que costumam sustentar as proposições do autor. Jornalista destemido e escritor criterioso, Fernando Jorge é dono de invulgar conhecimento sobre o mundo cultural brasileiro e seus bastidores, nada escapando de uma memória que semelha um arquivo ou enciclopédia, com o acréscimo de que sabe tirar as ligações entre os fatos e suas conseqüências de forma admirável. Em resumo, - e como indica o título do livro, - ele vai além da biografia convencional, embora também o seja, porque o leitor sente a figura humana do biografado pulsando em suas ações e reações diante das circunstâncias criadas pela vida. É um livro saboroso, bem escrito e corajoso, no qual o autor não se furta às críticas abertas quando lhe parecem merecidas.

Paulo (de Oliveira Leite) Setúbal nasceu na cidade de Tatuí, no Estado de São Paulo, e faleceu na capital (1893/1937), com 44 anos de idade. Foi um dos escritores mais célebres de seu tempo e autor de livros que se tornaram leitura obrigatória dos brasileiros: “Alma Cabocla” (poesia), “As Maluquices do Imperador” (crônica histórica), “A Marquesa de Santos” (romance), “O Sonho das Esmeraldas” (romance) e “Confiteor” (memórias póstumas), que figuram entre os mais conhecidos. Este último, “escrito com o coração”, apaixonou gerações de leitores. Pesquisador meticuloso, ele se aprofundava nos temas históricos, em torno deles estruturando seus romances em que a imaginação funcionava, mas sem desvirtuar os acontecimentos verdadeiros. Aprimorou essa técnica ao extremo, tornando-se inigualável no gênero, e foi por várias vezes imitado sem sucesso. Usava linguagem simples, embora nada tendo de pobre. Pertenceu à Academia Brasileira de Letras e a outras instituições culturais.

Aspecto nem sempre lembrado é que Paulo Setúbal viveu em nosso Estado durante quase dois anos (1919 e 1920). Como tantos poetas, ele contraiu tuberculose, na época também conhecida pelos eufemismos de tísica ou peste branca, ou seja, “ficou apenas um pouco fraco do pulmão” – como dizia. Por recomendação médica, resolveu mudar-se para Lages, onde costumavam tratar-se outros doentes do mesmo mal. A cidade campeira tinha ar puro e saudável, o que contribuía para a cura de um mal que fugia dos recursos médicos de então. Instalado na cidade, fez sucesso como declamador e conferencista, escreveu para os jornais locais e freqüentou as rodas onde pontificavam Nereu Ramos, Manuel Tiago de Castro, Cândido de Oliveira Ramos e outras figuras gradas. Para completar, ganhou muito dinheiro na advocacia, tendo patrocinado causas de repercussão. Homem simpático, risonho e bem falante, deixou por lá grande círculo de amigos. Sua passagem pela terra lageana, no entanto, não influenciou sua obra. Em seu livro de memórias recorda momentos daquele período.

O crítico catarinense Nereu Corrêa fez um levantamento completo da passagem do escritor pelo nosso Estado e tudo documentou no livro “Paulo Setúbal em Santa Catarina”, editado pela UDESC, em 1978. Como em geral acontece com livros de editoras oficiais, permaneceu semi-secreto e não obteve repercussão, embora Fernando Jorge o mencione diversas vezes, valorizando-o como trabalho sério e confiável. Creio que fui dos únicos a comentá-lo na imprensa na época de seu lançamento.


(12 de dezembro/2009)
CooJornal no 662


Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

Direitos Reservados