08/08/2009
Ano 12 - Número 644


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




O RETORNO DO “VELHO HEM”


 

O mundo literário é repleto de surpresas. Às vezes certo autor parece esquecido, relegado ao abandono, ou marca passo numa carreira vagarosa quando algum fato qualquer, nem sempre perceptível, faz renascer o interesse por ele e sua obra, provocando seu retorno à primeira linha. Segundo leio nos suplementos e páginas literárias dos jornais, é o que vem acontecendo com o escritor norte-americano Ernest Hemingway (1899/1961) em todo o mundo. É verdade que ele nunca esteve nos ostracismo, sempre foi lido e imitado, mas agora algum fato difuso determinou um repentino crescimento do interesse dos leitores por sua figura e seus livros. É mais um retorno triunfal do Velho Hem, como o chamavam os mais íntimos, que se repetiu por várias vezes em sua vida. Quando afirmavam que estava esgotado e não tinha mais o que oferecer, ele publicava uma nova obra e recebia um prêmio; quando juravam que estava liquidado, publicava “O Velho e o Mar” e ganhava nada menos que o Prêmio Nobel. E assim por diante, mesmo depois de ausente há mais de quarenta anos, como acontece hoje.

Hemingway foi dono de um estilo único, criado com muito empenho e esforço, sempre imitado sem sucesso. Simples na aparência, valorizando e dominando o diálogo como poucos, produziu romances, novelas e contos que encantaram gerações de leitores. É uma literatura de ação, de movimento, refletindo seu modo ativo de vida, e na qual o descritivo vai aparecendo aos poucos, entremeado na própria narrativa. Nos seus contos estão presentes caçadas, pescarias, viagens, combates, touradas, boxe, jogos de cartas, brigas, bebedeiras, crimes, amores frustrados, safáris e por aí além. Seus personagens em geral são homens valentes, decididos, estóicos. Muitas de suas histórias têm fundo memorialista ou autobiográfico, pelo menos em parte. E também foi mestre na escolha dos títulos: “A vida breve e feliz de Francis Macomber”, “As neves do Kilimanjaro”, “Colinas parecendo elefantes brancos”, “História natural dos mortos”, “Um lugar limpo e bem iluminado”, entre muitos outros, deram nomes a seus contos. Entre os romances mais conhecidos estão: “O sol também se levanta”, Adeus às armas”, “Por quem os sinos dobram”, “Do outro lado do rio entre as árvores” etc. Todos se tornaram conhecidos ao redor do mundo. É um dos autores mais filmados de toda a história literária.

Escrevia à mão, corrigindo e emendando sem cessar, mas os diálogos eram datilografados na máquina instalada em mesa tão alta que lhe permitia trabalhar em pé. Referindo-se às suas histórias, afirmou: “Prefiro trabalhá-las e poli-las bastante, prefiro ter de colocá-las, por assim dizer, numa espécie de bigorna, martelá-las até forjá-las a contento, ou mesmo apenas moldá-las numa pedra já formatada, e assim saber que tenho algo sobre o que escrever...” Nada de material claro, brilhante, já pronto, guardado no armário mas fora de uso. Talvez por isso seus escritos dêem a sensação de liberdade, ar puro, ambientes largos, natureza viva, ingredientes que fizeram dele um campeão de vendas em todo o mundo e lhe permitiram a existência ativa e movimentada que sempre desejou. Transformado num dos maiores mitos do Século XX, o Velho Hem é personagem central de tais e tantas histórias que é quase impossível distinguir a verdade histórica da lenda e da fantasia.


 
(08 de agosto/2009)
CooJornal no 644


Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

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