02/05/2009
Ano 12 - Número 630


 

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO

 

Enéas Athanázio




NOSSOS PARQUES TINHAM MAIS VIDA


 

A maioria dos parques brasileiros, - nacionais, estaduais e municipais - está em estado deplorável, entregue ao abandono ou em vias disso. O descaso pelo patrimônio natural, ecológico, arqueológico, histórico, artístico etc. é uma constante, de norte a sul. Entre os abandonados mais recentes, pelo que leio nos jornais, figura o “Parque Nacional Serra da Capivara”, no Piauí, Estado pelo qual nutro simpatia e admiração, como não ignoram aqueles poucos que me dão a honra de ler estas mal traçadas.

O abandono desse parque, entregando-o à ação de caçadores, madeireiros, vândalos e invasores é um verdadeiro crime de lesa-pátria, como se dizia naqueles tempos em que ainda se venerava a pátria. É uma das maiores e mais ricas reservas naturais de todo o mundo, guardando grande quantidade de fósseis, elementos geológicos, vegetação variada e exuberante e fauna riquíssima, sem falar na beleza natural, propícia ao turismo, e o patrimônio antropológico que fornece informações sobre o homem brasileiro da região, desde os primórdios, passando pela colonização portuguesa e até os dias de hoje. É impressionante a quantidade de vegetais existentes, mamíferos, aves, insetos, répteis e anfíbios, além das inúmeras espécies identificadas, constituindo-se num patrimônio cultural inigualável. As cavernas, “cuestas”, “canyons”, caldeirões, olhos d’água, tocas e baixões são de uma variedade impressionante, destacando-se a Pedra Furada, um dos acidentes geológicos mais conhecidos. Pinturas rupestres, vestígios de fogueiras, urnas funerárias e fósseis variados despertaram a atenção dos cientistas em busca de respostas sobre o homem pré-histórico e seu mundo. Todo esse fantástico patrimônio é gerenciado pela Fundação Museu do Homem Americano (FUNDHAM), em parceria com o Ibama e o Ministério da Cultura. Sua presidente é a Dra. Niède Guidon, arqueóloga de grande renome, autora de estudos e ensaios publicados em revistas especializadas do Brasil e do Exterior. Com esforço inimaginável, lutando sempre com a carência de recursos, ela e os abnegados membros da Diretoria vêm mantendo uma luta incansável pela preservação do Parque.

Mas agora... como tantas vezes acontece em nosso país, o dinheiro da parceria não chegou! A burocracia e, com certeza, a politicalha enrustida cortaram verbas indispensáveis e a Fundação se vê na contingência de suspender o serviço de manutenção e entregar tudo à própria sorte. Até o momento em que escrevo, 38 funcionários haviam sido demitidos e a presidente declarou que continuariam os estudos e pesquisas mas não se responsabilizariam pelo acervo por absoluta falta de recursos. É uma tristeza, uma página de melancolia, um momento de frustração. Quando se gasta tanto em bobagens, um patrimônio que orgulharia qualquer país é ameaçado de abandono.

Não é apenas lá que isso acontece. O parque da Santur, local de tantos eventos memoráveis, parece estar se deteriorando. O santuário de Azambuja, local paisagístico e de veneração popular, também exibe vestígios de decadência. Basta olhar e a triste realidade entra pelos olhos.
Não creio que palavras mudem a situação. Fique, pelo menos, registrada a indignação.
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PS – Em julho de 2006, a Dra. Niède Guidon anunciou que deixava o Parque, cansada do descaso do Governo e sem esperança de salvá-lo.


 
(02 de maio/2009)
CooJornal no 630


Enéas Athanázio,
jurista e escritor
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC

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