01/12/2018
Ano 22 - Número 1.103

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CARLOS TRIGUEIRO

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Carlos Trigueiro


ARRASTAO DE MARCAS CEARENSES


Carlos Trigueiro - CooJornal




Sou cearense dos Grupos Escolares Elvlra Pinho e dos Merceeiros; passeador em lombo de jumento calejado nas romarias a Canindé; frequentador de sessões matinais no Cine Rex e de matinées com seriados do Batman e do Super-Homem nos Cines Moderno e Majestic.

Ginasiano do Colégio Lourenço Filho graças ao primeiro lugar obtido no Exame de Admissão com direito a fotografia e historieta em jornal; bisbilhoteiro da Livraria Alaor, da Casa Juvenal Galeno na rua General Sampaio, do Teatro José de Alencar e, acompanhado de meu pai, dos salões da antiga e extinta sede da Phoenix Caixeiral, onde havia encontro dominical de leiloeiros, colecionadores de peças e moedas antigas, de selos postais, e disso e daquilo outro que o tempo levou.

Leitor curioso do jornal O Unitário; perambulante das Praças do Ferreira, do Carmo, e da Sé; presenteador de picolés às namoradeiras pra lá de assanhadas na Sorveteria Figueiredo - bem no canto da frondosa rua Senador Pompeu com a garbosa av. Duque de Caxias.

Peladeiro com bola de meia nas calçadas da rua Pedro I e com bola de borracha na Praça da Bandeira; caçador implacável com baladeira artesanal e pedrinhas de piçarra: de sanhaçus, sibites, rolinhas “caldo de feijão”, “fogo-pagou" e tijubinas rastejantes nas margens do Rio Cocó. Andarllho sobre quebra-mares desde a Praia de Iracema ao Mucuripe alternando areais, dunas e coqueirais; olheiro entusiasta das jangadas artesanais nas mãos dos jangadeiros tradicionais com seus samburás, toaçus e araçangas a oferecer cavalas, garoupas, ciobas, ariacós e lagostas recém-pescados no mar de esmeralda. Apanhador furtivo - ou em bandos de moleques - de abius, sapotis, seriguelas, cajus, atas, goiabas, cajaranas, pitangas nos terrenos baldios do bairro da Aldeota, Porangaba, ou até mesmo da orla marítima.

Frequentador da missa dominical, manhã muito cedinho, na Igreja de São Bernardo, esquina das ruas Senador Pompeu e Pedro Pereira, onde meu irmão caçula, Nonô, paramentado de Coroinha era ajudante da missa e, muitas vezes, mais que isso, pois se transformava em espécie de anjo da guarda ao socorrer meninas-moças que, de pé ou ajoelhadas, desmoronavam ("piloravarn" como se dizia naqueles tempos) no chão bruto, vitimadas pelo longo jejum obrigatório, na época, antes do ato da comunhão.

Já disse isso, falado, escrito, cantado, chorado e copiado, mais de mil vezes: "Saí do Ceara no dia 09 de dezembro de 1956, em um voo pinga-pinga do extinto Lóide Aéreo Nacional rumo ao Rio de Janeiro, mas o Ceará nunca saiu de mim!"




Texto arrastado do livro "ARRASTÃO DE TEXTOS - Ficção de Verdade(s)",
publicado pela 7Letras Editora/RJ






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Comentários sobre o texto podem ser encaminhados ao autor, no email
carlostrigueiro@globo.com

 


Carlos Trigueiro é escritor e poeta
Pós-graduado em "Disciplinas Bancárias".
Prêmio Malba Tahan (1999), categoria contos, da Academia Carioca de Letras/União Brasileira de Escritores para “O Livro dos Ciúmes” (Editora Record), bem como o Prêmio Adonias Filho (2000), categoria romance, para “O Livro dos Desmandamentos” (Editora Bertrand Brasil). RJ
contato@carlostrigueiro.art.br
www.carlostrigueiro.art.br



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